sábado, 30 de junho de 2007

Cogitações avulsas

Babam no canto da boca, enquanto bamboleiam as ancas e sinalizam a (in)existência de cérebro com piscares insistentes de olhos.
São às dúzias, aos molhes. De copo na mão cirandam pelos recinto; introduzem-se insidiosamente como se de humidade se tratassem. Interrompem e querem fazer-se notados através de vocábulos guturais berrados aos ouvidos. E tocam. Colocam-nos a mão no ombro ou tentam rodear a cintura com as suas mãozinhas gordurosas e ansiosas, mostrando os dentinhos por entre os lábios que supostamente esboçam um esgar sedutor. No final, ainda têm a lata de perguntar "se ofenderam".
Cara criatura, como fazer-te entender que não ofendes? Que apenas provocas uma incrível sensação de asco?

(Fotografia de Joel-Peter Witkin)

sexta-feira, 29 de junho de 2007

quarta-feira, 27 de junho de 2007

Depois da espera, vieram os bordões!

Hoje, nas matrículas, senti as costuras da minha paciência rebentarem...
Faltava uma aluna. Que nervos! Faltava só T. para completar a minha "listinha". Eu estava cheia de fome e bastante saturada.
Eu poderia ter ido embora e ela depois que pagasse multa. Mas fiquei, esperei e esperei.
Eu sou mesmo assim, não gosto, mas farto-me de esperar. Nunca desisto de esperar e de desesperar.
Por fim, lá veio a sr.ª T. toda contentinha. Eu dei-lhe o sermão e ela ouviu-me muito sorridente, pois era-lhe familiar, não fosse ela uma aluna especializada em faltar. Uma verdadeira "faltista".
................
- Vá lá, despache-se! A secretaria vai fechar e eu tenho coisas para fazer!
- Mas à vinda houve tipo um acidente! E não deu para chegar mais cedo.
- Mas é sempre o mesmo tipo de justificações que dá!
- Professora, tipo, eu sou de longe e, tipo, eu, por vezes, tipo, perco o autocarro.
- Ó T., se é uma pessoa adulta, tipo 18 anos, deveria ser mais responsável.
- Mas eu sei, professora, eu, prò ano, tipo, vou logo atinar no início! Vai ver.
- Ok, mas agora despache-se porque eu estou com um tipo de fome que já nem consigo ver.
....................
E, no bar, eu continuei, tipo:
- O que deseja sr. ª professora?
- Nem sei.... Olhe, dê-me... tipo uma sopa!
Conclusão: QUERO FÉRIAS!!

Pérolas a porcos

"Amor. Claro, o amor. Fogo e chamas durante um ano, cinzas durante trinta. Ele bem sabia o que era o amor..."
O Leopardo, Giuseppe Tomasi di Lampedusa

terça-feira, 26 de junho de 2007

Habituados ao lado sombrio da existência colectiva...

( pintura de Paula Rego)

"(...)
Sem pretendermos formular causas primeiras que originariam todas estas modalidades de violência, parece-nos que a acumulação, ao longo dos séculos, de muitas práticas não criticadas, nem erradicadas, em que o antigo sempre se misturou com o que já foi moderno e um e outro sempre se misturaram com o moderno que " está a dar", conduziu a maior parte dos Portugueses a uma vida social e cultural medíocre, em que vivemos:
-habituados a uma grande impotência individual e colectiva;


-habituados a péssimos seviços públicos, como se fossem de favor;


- habituados a suportar um urbanismo caótico e sistemas de transporte absurdos;


- habituados a ler pouco e a pouco debater;


- habituados a uma quase nula vida assocativa e interventora;


- habituados à "cunha", ao "desenrascanso" e à pequena corrupção activa;


- habituados... aos brandos costumes que tudo corróem sem dar nas vistas.


Este é o lado sombrio da existência colectiva.


Augusto Joaquim"


JEAN, Georges, "E, em Portugal, como é?(excerto)" in O Racismo Contado às Crianças, 1ª edição portuguesa: Terramar, Junho de 1997

O meu pobre coração não aguenta 5


Ok, ok. Certo é que à História não podemos fugir. Portanto, plenamente ciente que Marco António vai apanhar com a fúria do engomadinho do Octávio, de que vai enamorar-se da egípcia (que não a nossa) e andar mais uma data de episódios a bater-se contra o puto. Mas a verdade é que aqui não interessa o final da História, mas sim como a(s) estória(s) se desenrolam.
No episódio anterior - muito, mas mesmo muito bom (ao ponto de me pespegar com uma insónia incrível), assistimos à execução de Cícero. Só percebemos Cícero nos momentos de crise; em todos os outros conspira e acobarda-se. Conhecemos o executante e desculpamos a infantilidade com que enterra a espada no pescoço do advogado, logo após ter-lhe pedido para apanhar os pêssegos maduros da sua casa.
Octávio cansa-me com tanto aprumo - deliciosa a tirada de Átia "Todos sabemos como és inteligente. Não precisas recordá-lo".
Marco António enoja-me com os seus arrotos de cérebro a vazio. Tão vazio, que ainda não percebeu a índole de Octávio, que será a sua perdição.

As mulheres. As mulheres são sublimes. No episódio que rodou ontem, Átia caminha lentamente para a decadência, profetizada/lançada/prometida por Servília, que se imola à porta da eterna inimiga. O olhar de morte de Servília alcança imediatamente Átia, que sabemos começar lentamente a morrer ali mesmo. Nada escapa ao olhar (de morte).
"Send her bitterness and despair for all of her life". Nem à palavra (mal)dita.

domingo, 24 de junho de 2007

Tigres e Dragões (de papel)

Estamos bem cientes das acusações do Ministério da Educação. Na verdade, apenas revela a astúcia dos corredores do chico-espertismo, que já todos percebemos ser condição dos elementos constituintes deste Executivo que, infelizmente, elegemos. O Ministério, dizia eu, mais não faz que alimentar a fogueira da opinião pública em relação à classe docente. Razão tem em algumas considerações; como em todos os ramos, a docência tem a sua cota parte de incompetentes, de parasitas e de alienados. Como em outras áreas, repito. O Ministério - porque não falamos apenas da Ministra - acusa-nos de pouco trabalho. De laxismo, de incompetência. Passo o ano a tentar equilibrar planificações, documentação burocrática, elaboração de fichas para os alunos, grelhas e avaliações. Raramente tenho um fim de semana despreocupado. Se o digo não será porque não gosto de o fazer; adoro leccionar e só lamento o excesso de burocracia que, infelizmente, tal implica. Por tudo isto, não compreendo como uma equipa que passa o ano inteiro com o intuito de elaborar um exame nacional, ainda assim o faz com erros grosseiros: não leccionam, não têm aulas para preparar, não estão obrigados a reuniões de coordenação pedagógica semana sim, semana sim senhor. Então, porque falham na única coisa que fazem? Como explicar o erro do exame nacional de História, que ainda por cima foi desvalorizado? Como explicar que quem elaborou o exame de Filosofia fizesse o impensável, ou seja, ater-se especificamente em dois filósofos, quando o programa é aberto? Como explicar o erro crasso do exame de Físico-Química? E a lata dos meios de comunicação em congratular o GAVE pela prontidão com que detectou o erro. Patético, se não fosse tão grave. Mais um ano que passa e nada é tirado a limpo? Onde reside a excelência e o rigor que se reinvindica ao resto da classe docente?

É muito bom, adorei! Boa música, Woman. Merci.

Lullaby de Domingo

What I choose is my voice (...) I send this smile over to you

sábado, 23 de junho de 2007

E quando descobrir o gato das botas...

Sendo gata - e loira - Kiara é atípica. Alguns generosos visitantes deste blog já o sabem. É introspectiva e ligeiramente desequilibrada. "Posta" e tem direito de resposta. Envolve-se em discussões fundamentadas com outros escribas do sítio. Em suma, falta-lhe estar em duas patas ou então colocar-nos a nós de quatro. Há muito que sei que tenta enriquecer os conhecimentos que adquiriu ao longo destes sete anos de vida. É fã absoluta do Odisseia e de alguns documentários da 2, sobretudo os que versam sobre vida selvagem, espécie estranha para a moça, como já foi dito por cá. Pois bem, descubro-lhe hoje uma faceta bem mais lúdica. Kiara encontra-se a assistir ao Shrek que passa neste momento na SIC. Está arregalada e completamente deliciada, ao ponto de não tratar do pêlo há, pelo menos, 30 minutos. Suponho que seja a primeira vez que vê um burro que fala.

quinta-feira, 21 de junho de 2007

quarta-feira, 20 de junho de 2007

10 Mandamentos, se faça favor!

(pintura de Magritte)

Estávamos todos no café a partilhar os nossos fados. Algumas melodias eram bem tristes, mas ninguém estava com vontade de chorar, muito pelo contrário.
Fados castiços, pois então.
A história mais castiça foi a do ente de sexo feminino que tinha sido colocado num centro prisional para dar aulas de Português. Os responsáveis por aquele estabelecimento tinham já avisado que ali não era aconselhável usar vestimentas demasiado… femininas. Foram-lhe dadas informações concisas, directas e claras acerca do que era saber-estar entre penitentes.
Naquele momento, a roupa era um mal menor, pois já tinha reformulado o seu guarda- roupa. Agora o problema era o programa, os conteúdos programáticos, ou, para ser mais clara, que textos iria explorar com aqueles alunos?
Todos discutimos, reflectimos, meditámos sobre aquele processo de ensino-aprendizagem específico, com o objectivo de darmos soluções, ideias e, no caso de ser preciso, saídas rápidas e eficazes.
Quando o assunto já só vagueava nos olhares, alguém de manha só reconhecida pelos seus mais chegados e queridos diz: “ -Por que não começas a analisar a morfologia e a sintaxe dos Dez Mandamentos do Antigo Testamento? “Não matarás; Não roubarás; Não…”
O serão prolongou-se muito agradável; os sons jazzísticos que por ali pairavam, por fim, tinham penetrado nos nossos espíritos e, de vez em quando, alguém lembrava ou inventava um mandamento e pronunciava-o em alto e bom som para gáudio dos presentes.


Os Dez Mandamentos Católicos:
Adorar a Deus e amá-lo sobre todas as coisas.
Não invocar o Seu santo nome em vão.
Guardar os domingos e festas.
Honrar pai e mãe (e os outros legítimos superiores).
Não matar (nem causar outro dano, no corpo ou na alma, a si mesmo ou ao próximo).
Não pecar contra a castidade (em palavras ou em obras).
Não furtar (nem injustamente reter ou danificar os bens do próximo).
Não levantar falsos testemunhos (nem de qualquer outro modo faltar à verdade ou difamar o próximo)
Não desejar a mulher do próximo.

domingo, 17 de junho de 2007

A sabedoria do rei Salomão

(Em momentos de crise, os sábios de hoje em vez de utilizarem espadas, abrem janelas...)

Qualquer coisa começa emitir sons. O professor tenta perceber de onde vêm os sons. Passado algum tempo, encontra na gaveta da sua secretária um aparelho parecido com um rádio, que talvez até fosse… sei lá.
Na fase seguinte, o professor pergunta de quem é o “radiozinho”, pois quer devolvê-lo.
Depois de várias tentativas e pela confusão que se instala, abre a janela e diz: - ok, meus meninos, já que isto não tem dono, eu vou atirá-lo! Será de quem o apanhar.
Por fim, uma voz bastante atarantada interrompe aquela acção: - NÃO ATIRE! NÃO ATIRE!!! É MEU!

Nota: a voz da experiência diz-me que há métodos que resultam sempre, são intemporais!

Lullaby de Domingo

Voz quente a embalar um fim de semana de chuva. (Genuinamente, uma lullaby)

sábado, 16 de junho de 2007

OTArios

As politiquices dos OTArios:http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1296714 Nota: ponham os acentos, se quiserem...

Dor que desatina sem doer 4

Se compararmos o retrato de Orlando homem com o de Orlando mulher, veremos que embora os dois sejam indubitavelmente uma mesma e única pessoa, são de assinalar certas mudanças. (...). O homem olha de frente o mundo, como se este fosse feito para seu usufruto e talhado a seu gosto. A mulher deita-lhe um olhar enviesado, cheio de subtileza, ou mesmo de desconfiança. Se usassem os dois as mesmas roupas, é possível que a sua visão do mundo fosse a mesma. É a opinião de alguns filósofos e sábios, mas bem vistas as coisas inclinamo-nos para outra explicação. A diferença entre os sexos é, felizmente, uma diferença de grande profundidade. A diferença entre os sexos é, felizmente, uma diferença de grande profundidade. As roupas são apenas o símbolo de algo que se oculta mais fundo. Foi uma mudança operada na própria Orlando que ditou a sua escolha do trajo e do sexo feminino. e talvez com isso estivesse apenas a exprimir mais francamente do que é hábito - a franqueza era, de facto, a alma do seu carácter - algo que sucede à maioria das pessoas, sem ser assim claramente expresso."
Orlando, Virginia Woolf

sexta-feira, 15 de junho de 2007

Cogitações avulsas

Gostava mesmo de saber de quem foi a brilhante ideia de colocar uma data de marmanjos estranjas (desses que aparecem nos filmes a falar ingalês) a mandar "beejeinhos à Ana Maaarrquex". E com aquele remate da moça no final a sorrir, muito contentinha (supostamente com os beijinhos, pois então). Credo, que mau. Eu bem sei o que pensaria se me dissessem para mandar beijinhos, frente a uma câmara, para uma gaja que não conheço e ainda por cima numa língua assim, sei lá, a lembrar o russo. (PS: Refiro-me a um separador que passa na Sic Mulher)

quinta-feira, 14 de junho de 2007

Adeus, não afastes os teus olhos dos meus

Quando dormes E te esqueces O que vês Tu quem és Quando eu voltar O que vais dizer? Vou sentar no meu lugar Adeus Não afastes os teus olhos dos meus Isolar para sempre este tempo É tudo o que tenho para dar Quando acordas Por que quem chamas tu? Vou esperar Eu vou ficar Nos teus braços Eu vou conseguir fixar O teu ar A tua surpresa Adeus Não afastes os teus olhos dos meus Eu vou agarrar este tempo E nunca mais largar Adeus Não afastes os teus braços dos meus Vou ficar para sempre neste tempo Eu vou, vou conseguir pará-lo Vou conseguir pará-lo Vou conseguir Adeus Não afastes os teus olhos dos meus Vou ficar para sempre neste tempo Eu vou conseguir pará-lo Eu vou conseguir guardá-lo Eu vou conseguir ficar Música de David Fonseca nota: Woman, eu apenas gosto da música... Vinha a ouvi-la no carro e gostei.

Tomar-lhes o pulso

10:55, aula de substituição a uma turma de 6º ano. Distribuo uma ficha de trabalho de Língua Portuguesa pelos alunos. Irrequietos, dispersos na possibilidade da aula que não teriam e afinal têm. Lá fora, no pátio, uma orquestra improvisada de instrumentos de percussão. Um quadro e a leitura rítmica de um excerto da Marcha Turca de Mozart (no intervalo, para minha delícia, tocava-se The Hall of The Mountain King, de Grieg), para quem quiser experimentar seguir a batuta do maestro de sapatilhas. Cá dentro, a inquietude de (ter de) fazer a ficha. Ouve-se o início do concerto. As cabeças começam instintivamente a acompanhar a melodia e ouço um incontido "É Mozart!" Acompanham cada vez mais a música que invade pelas janelas e afasta as cortinas. Afinal de contas, onde os perdemos? Quando começa Mozart a ser aborrecido? (E não gosto particularmente de Mozart, mas ontem amei o que a sua música provocou nos corpos dos alunos daquela turma.)

Dor que desatina sem doer 3

"Recordava como, no tempo em que era homem, exigia das mulheres que fossem obedientes, castas, perfumadas e primorosamente ataviadas. «Agora vou ter que pagar na minha própria carne esses desejos», reflectiu; «porque as mulheres não são (a ajuizar pela minha breve experiência de pertença ao sexo) obedientes, castas, perfumadas e primorosamente ataviadas por natureza. Só podem alcançar essas graças, sem as quais não gozam nenhum dos prazeres da vida, mediante a mais enfadonha disciplina."
Orlando, Virginia Woolf

quarta-feira, 13 de junho de 2007

Sobre o amor. Venha o diabo e escolha, porque eu não consigo.

Os nadas a preencherem os vazios…

- Lembras-te de mim? - Foste o meu grande-amor-nunca-vivido-e-depois-esquecido. De ti lembrar-me-ei sempre! - Ai sim, como é que eu era? - Lembro-me que tinhas os olhos azuis, eras especial… e… - Desculpa, eu tenho os olhos verdes! - Verdes?!... Não importa a cor, eras tu, disso eu lembro-me! - E depois? - Depois…lembro-me como nós gostávamos de baralhar os provérbios e de jogar xadrez com a condição de eu ganhar sempre. - Pois… - Nunca iria resultar… Dei-te muitas oportunidades, mas tu nunca fizeste um esforço, ganhaste-me sempre naqueles jogos. Ainda hoje recordo… Credo! Ainda bem que o tempo apaga algumas coisas, não achas?

Da maldição de certas palavras:

Estratégias para conversarmos a dois.

terça-feira, 12 de junho de 2007

Cogitações avulsas

Faz-me sempre muita confusão o pessoal que insiste em cuspir no prato onde sofregamente come. Admiro-lhes o estilo, o desdém aparente, a (suposta) superioridade moral e intelectual. In the end, frequentam os mesmos corredores, solicitam as mesmas audiências e suplicam ao sistema que os mantenha por favor, obrigadinho.

O meu pobre coração não aguenta 4


Octávio é um copinho de leite armado a mete nojo. Aos 19 anos, a pregar sobre como quer romanos honestos e romanas virtuosas (já para não referir a vassoura que certamente engoliu).*
Fora com o puto! Com mais vinte anos em cima, certamente ninguém o aguentará. Dass.

*Eu bem sei que Freud explica, provavelmente com aquele episódio em que a Mãe lhe dizia, divertidíssima, que ele precisava ser bem ******.

Acerca dos Professores Titulares

Quem não lecciona algures nos jardins atlânticos, vê-se confrontado com a figura de professor titular. Deixarei considerações mais profundas sobre a temática para outros posts, mas deixo-vos um cheirinho das infinitas possibilidades que tal proporciona. Eu, por mim, ainda jogo nas reservas!!!

Cupido Sénior

De regresso a casa, recordo-me dele(s) porque vislumbro um altivamente sentado a afinar as cordas sedosas do pêlo. Terei certamente outros gatos. Os nomes dos gatos amaldiçoam-se, e as pegadas dos predecessores assombram os seguintes. O primeiro Cupido não era meu, mas ajudei a dar-lhe nome. Preto e vadio, como este outro. Não nasceu em ilha, porque era gato de bairro a feder a mofo, de casas altas de soalho podre. Cupido sénior era o marialva da travessa, provocador nato dos outros gatos das redondezas, engatatão das gatas mais aristocratas. Convencido que era lorde, regressava a casa onde sabia ser pacientemente esperado. Trazia amigos, que em desespero morreram-nos nos braços; trazia inimigos, que num golpe bem calculado ainda o conseguiam puxar ao postigo. Cupido do Mondego era um verdadeiro estudante, sempre em fuga dos acéfalos que de capa e batina lhe queriam ensinar a palavra caloiro. Nunca lhe bateram nas unhas, mas apanharam-lhe diversas vezes o lombo e foi sempre salvo por mulheres. Por nós. Perdi-o quando saí da viela. Cupido ficou, pertença de outras que por lá também ficaram. Amei-o como se fosse meu ao ponto de, anos mais tarde, ao encontrar na ilha dentro da ilha outro com aquele mesmo ar de mafioso, não resistir a repetir-lhe o nome. Outro negro cintilante com sede de rua não poderia ser de forma diferente. Também lhe perdi o rasto. Nunca mais repito nomes aos gatos.

segunda-feira, 11 de junho de 2007

eu gosto do meu país

A Europa jaz, posta nos cotovelos: De Oriente a Ocidente jaz, fitando, E toldam-lhe românticos cabelos Olhos gregos, lembrando. O cotovelo esquerdo é recuado; O direito é em ângulo disposto. Aquele diz Itália onde é pousado; Este diz Inglatrra onde, afastado, A mão sustenta, em que se apoia o rosto. Fita, com olhar esfíngico e fatal, O Ocidente, futuro do passado. O rosto com que fita é Portugal. Fernando Pessoa, Mensagem (1934)

domingo, 10 de junho de 2007

Novamente com um surto de audição compulsiva de Cave. Chega de mansinho, e depois arrasta-se, prolonga-se, em repeat, por minutos, horas, dias seguidos. Eu disfarço, assobio para o lado, obrigo-me a cantarolar outras coisas, a ouvir outros registos, mas a ele regresso, sempre. Inconscientemente. Hoje foi assim. E já é a quarta vez que ouço, a subversiva I'm Your Man. Passo agora a "Weeping song". Parece-me adequada.


Today.... I have dreamed with words.

Lullaby de Domingo

Os domingos querem-se bem dispostos, agora que nos ameaçam com os dias azuis (receita mais abaixo). E antes que o trabalho aperte, uma lullaby a escapar ao habitual.

sábado, 9 de junho de 2007

o amante e o amado

John Waterhouse, Eco e Narciso

"O amante é mais divino que o amado, visto que naquele existe o deus e nestoutro não."
in Morte em Veneza, Thomas Mann

Receita para fazer o azul

Vi este poema e lembrei-me logo de ti, Woman. Lê com muita atenção: Se quiseres fazer azul, pega num pedaço de céu e mete-o numa panela, que possas levar ao lume do horizonte; depois mexe o azul com um resto de vermelho da madrugada, até que ele se desfaça; despeja tudo num bacio bem limpo, para que nada reste das impurezas da tarde. Por fim, peneira um resto de ouro da areia do meio-dia, até que a cor pegue ao fundo de metal. Se quiseres, para que as cores se não desprendam com tempo, deita no líquido um caroço de pêssego queimado. Vê-lo-ás desfazer-se, sem deixar sinais de que alguma vez ali o puseste; e nem o negro da cinza deixará um resto de ocre na superfície dourada. Podes, então, levantar a cor até à altura dos olhos, e compará-la com o azul autêntico. Ambas as cores te parecerão semelhantes, sem que possas distinguir entre uma e outra. Assim o fiz - eu, Abraão ben Judá Ibn Hain, iluminador de LOulé - e deixei a receita a quem quiser, algum dia, imitar o céu. de Nuno Júdice

quinta-feira, 7 de junho de 2007

quarta-feira, 6 de junho de 2007

Mademoiselle de La Palisse em noite de Quarta

Percebo a gravidade do meu estado quando olho para o relógio que assinala 22h e 40 minutos e penso que é tarde. A gravidade ainda é mais acentuada pelo facto de estarmos em véspera de feriado e supostamente não ter que acordar tão cedo. O funcionário da reprografia* diz-me que a culpa é da idade. Eu acredito. * Esquecimentos e paragens cerebrais animam o nosso relacionamento. Eu esqueço e ele ampara o jogo, claro. Sem a preciosa ajuda do dito, estaria perdida. PS: Cedo aprendi que a sobrevivência de um docente depende em grande parte dos funcionários da reprografia. E eu tenho tido sorte.

terça-feira, 5 de junho de 2007

A brincar a brincar. 2

É extremamente "amassador" corrigir provas e trabalhos.

O meu pobre coração não aguenta. 3

Conservou a cabeça. Continuaremos, pois, a acompanhar os movimentos de arena das duas "senhoras". Queremo-las vivas.
Se no episódio anterior Servília destilou puro ódio na infâmia de uma tentativa de assassinato, no de hoje esteve magnífica ao enfrentar a resposta de Átia:
Perante a eminência da tortura, sugere que o medo da sua carrasca é maior que o seu. E atreve-se a profetisar que a ignomínia do que está prestes a acontecer ensombrará o futuro da rival. (Será?)
Mesmo de joelhos, ou melhor, só de joelhos, Servília soube ser soberba.
(Segunda chegou e passou).

domingo, 3 de junho de 2007

Curioso...

...que o único homem que publica neste blog tenha escolhido o nick que escolheu. Alguém arrisca sobre o significado de LEKKER? Ps 1: Andamos nós aqui armadas aos cágados, inspiradas em história egípcia, mitologia grega, poemas medievais e fotografias com leituras feministas e aparece um único fulano que, de uma penada, confere um carácter gastronómico ao sítio. Reinvindicamos o "quarto". Resta-te a cozinha? Ps 2: Este post é uma tentativa descarada de fazer com que o rapaz dê sinal de vida. Afinal de contas, não é pago para estar quieto. Nem para se mexer, de resto. Por cá não pagamos. Só exigimos.

pois, eu até concordo!

a publicidade deveria ter mais homens e de preferência como este! vejam como resulta tão bem: (Que regalo... de café)

devo ter apanhado sol a mais...

( deveria ter ficado à sombra, como esta lagartixa.)
Esplanada com vista para o Atlântico, muito sol e um grupo de amigos é o melhor programa para o sábado, depois do almoço (para quem se esforça, não é senhora Woman?).

Enquanto esperamos pelo café, falamos que os gays qualquer dia são a maioria (o disparate reina na conversação).
Mais tarde, alguém diz que quer fazer uma revelação, e eu, no gozo, digo: “- Não me digas agora que és lésbica?”- e dou uma gargalhada bem idiota. Depois, faz-se silêncio. Por fim, ela esboça um grande sorriso e diz: “- Sim, eu sou lésbica!”.
Entretanto, vem o empregado e pergunta como queremos o café. Eu precipito-me e peço “o normal”, ela, logo a seguir, pede “o usual”. A mim,só ocorre-me o comentário: “- Estiveste bem…”

Enfim, eu fui a anedota da tarde.

SUSPIRO!

Não existe coisa que me enerve tanto (pronto, existem mais alguns pontos igualmente enervantes), quanto esse lugar comum de que trabalhar com muitas mulheres só pode dar chatice, porque: Muitas mulheres juntas só pode originar confusão. As mulheres são conflituosas. As mulheres são competitivas. As mulheres são cuscas (não no sentido das minhas queridas, mas no outro). As mulheres... Ora, não posso acreditar na honestidade intelectual de alguém que parts de tais premissas. Cada qual vê apenas o que quer ver e raciocínio toldado por tanta porcaria não poderá tirar conclusão isenta e criteriosa. E só nos livraremos das etiquetas que insistimos em perpetuar quando decidirmos ser mais críticos quanto ao que nos incitam a tomar como certo. Trabalho com homens e mulheres. Não me parece que a competência, sobriedade, mesquinhez ou estupidez seja uma questão de género. Agora, acredito que uma mulher que chegue ao local de trabalho com a ideia pré-concebida de que encontrará chatices por trabalhar com outras mulheres, efectivamente as encontre. Só muito raramente não encontramos o que procuramos. Mas isto sou eu, que tenho a mania que sou Ista.

desculpem-me, mas até tem piada...

Lullaby de Domingo