sábado, 31 de janeiro de 2009


acabo de dar de caras com um blog escrito por uma jornalista.

não sei se me entristeça por perceber que a cachopa dá pouco uso às aspas, embora por vezes, acrescente um eufemístico "adaptado de" ou se me espume por achar que o recurso a plágios que nem plágios chegam a ser "[escrito após inspiração de... e blá, blá, blá ou inspirada nas palavras de"] me deixam fora de mim.
Se não têm imaginação/disponibilidade mental para arranjar títulos de posts para acompanhar fotos, ó pleaseeeeeeeeeeeeeeeeeeeee, pelo menos, citem a fonte.... afinal de contas, é uma das regras básicas de qualquer jornalista, independentemente de ser blogger, ou não.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Pausa delicatessen




em jornada prolongada de trabalho.
Danke Nefertiti.

Da (im)POSSIBILIDADE

A infelicidade de não ponderar bem o que dizemos cria situações desconcertantes. Depois de termos um bispo a afirmar que "não acredita" na existência das câmaras de gás nos campos de concentração, temos um padre que acredita que é uma impossibilidade absoluta um católico ser anti-semita. Como sabemos, a História tem-no provado. De qualquer modo, acho ternurento que se ateste desta forma uma crença absoluta na isenção de qualquer rastro de preconceito (desta natureza) na mente do católico contemporâneo.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Sim, senhor (Primeiro) Ministro

É lamentável parafrasear Funes (pergunta antes o que podes fazer para nos livrarmos do Sócrates), mas a situação torna-se cada vez mais incomportável. Tenhamos nós vergonha e não promovamos este senhor novamente a Primeiro do País. É mauzinho (o País), mas nem tanto.

"Amanhã é sempre longe demais"

Pela janela mal fechada
entra já a luz do dia
Morre a sombra desejada
numa esperança fugidia
(...)
Dizes-me até amanhã
que tem de ser que te vais
Porque amanhã sabes bem
é sempre longe demais
(...)
Rádio Macau

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

O movimento do anoitecer

Lume brando por acaso espelho
Abelha e pena perdida
Longe do feixe das ruas
Das famílias das reformas

Diante dos teus olhos lume brando
Que te soergue as pálpebras
E que passa e que se vai
Na noite límpida e fresca

Para outros olhos exactamente iguais
Cada vez mais escurecidos
Cada vez mais apagados
Cada vez menos existentes.

Paul Éluard
Traduzido por Maria Gabriela Llansol

No final do poema, é já noite.

domingo, 25 de janeiro de 2009

Lullaby de Domingo

Emprestai o ouvido ao Senhor, pois ele é o meu pastor:
"I say prolix! Prolix. Something a pair of scissors can fix"





Nick Cave - Call Upon the Author


sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

A mais radiosa flor do ramalhete funiano

Qualquer dia Funes associa-se de vez a DM e percorrem as cidades do País com um autocarro fretado para o efeito, em que se pode ler: "Provavelmente Derrida é uma porcaria. Portanto, pare de se preocupar e dedique-se alegremente à denúncia da psicofoda*."

*Lembre-se, caro Funes, que a terminologia é do seu amiguinho que foi buscá-la não sei a quem.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Post it aberto ao Jorge

O tipo engasga-se, decide repetir a cena toda, e eu é que sou a chatinha? Quando não morávamos juntos, nunca me chamaste de chatinha. Agora, nem passada uma semana desde que juntámos trapos, já andas nisto.

Em trânsito

A morte espreita em todos os quadrantes e este ano tem sido uma companheira afã dos dias gélidos. Por sua causa, desloquei-me até uma catedral da senhora, que recebia em braços mais uma companheira. Fiz-me acompanhar por alunos, que queriam prestar homenagem à pessoa que desaparecia a alguns dos seus queridos.
Esta catedral da senhora não é muito diferente das restantes; os mesmos caminhos apertados por entre os pousios de memória, cheios de gente que acompanha quem por lá ficará a partir de agora. O momento é solene, os rostos sabiamente sombrios. E depois eu, pequenina, no meio dos meus alunos, imóveis espectadores da cerimónia. Findo o ritual, as pessoas começam lentamente a movimentar-se e a cumprimentar os conhecidos. algumas realmente pungidas, outras respeitosas, as restantes preocupadas em fazer-se notadas. No meio dessa azáfama disfarçada, acerca-se de mim uma senhora, compostamente de negro que balbucia algo ao meu ouvido. Percebo qualquer coisa muito difusa; uma espécie de "para ir" e estranho que alguém me solicite informações em tão estranho sítio. As atenções dos meus alunos concentram-se no episódio; logo a mim, que mal conheço o local, pedem-me informações. Em voz baixa peço à infeliz senhora que repita o que me pede. Só então compreendo a importância da sua mensagem; por entre centenas de pessoas, aquela piedosa senhora escolhe-me a mim para constatar o que para ela é seguramente um facto: se todos queremos ir para o céu, todos teremos que passar por aqui.

People are strange when you're a stranger...

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Alienações que dão algum jeito

Pelos vistos toda a gente ouviu atentamente dois marcos da actualidade: o discurso de tomada de posse do Obama e a entrevista do Cristiano Ronaldo à Judite de Sousa. Eu não ouvi nenhum dos dois e estou algo satisfeita com a situação: o primeiro poderia pecar por excesso (eu não sei, não ouvi e tendo a passar por cima dos posts que falam sobre isso) e o segundo por falta (sobre este já não atropelo os posts porque aprecio sobremaneira os protestos sobre o facto de não podermos exigir ao miúdo um discurso escorreito). É claro que este post serve apenas como desculpa para, pelo menos uma vez, escrever estes dois nomes por cá - Obama e Cristiano Ronaldo - que é para não ficarmos completamente fora de moda.

Paradoxos: uma coisa que é e não é ao mesmo tempo

Sobre o autocarro que insiste em paragens sucessivas pelo Jugular, apenas dois pormenores que me fazem confusão: o advérbio de modo provavelmente (então um ateu não tem absoluta certeza que Deus não existe?) e o recurso à evangelização, metodologia marcadamente cristã.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Ampulheta funiana?

A ampulheta funiana afinal é bem maior do que julgávamos. Após uma crise existencial, Funes acrescenta mais alguns nomes que escorrem como areia pelo seu pensamento. Nós achamos que sim, há que dar algum crédito a reacções viscerais: DELEUZE, MARCUSE, ALTHUSSER, SARTRE E SIMONE DE BEAUVOIR (neste caso alguma confusão com o nome, mas nada de grave). Acresce ainda LYOTARD. Assim, parece-nos que o que primeiramente julgamos uma ampulheta é na verdade um ramalhete, dada a profusão de nomeações. Arriscamos também que muitos nomes ficaram certamente de fora. HEIDEGGER, por exemplo, só para nomear um. E já imaginamos Funes com o bouquet no regaço, a responder ao questionamento: São rosas, minha senhora, são rosas.

Acaso sabias que nunca tive o quarto arrumado?



Encontrei as palavras no meio da caixa, do papel escrevinhado com uma caligrafia familiar, porém irreconhecível.

esqueci mesmo muitas coisas a teu respeito. Nunca me escreveste, pois não?

e a tua mão a chegar ao meu rosto, naquela agressão longínqua. Só eu ligava aos números, às datas, às horas. Tu não. Mas eis que o algarismo perdido volta e aparece pela primeira vez para ti, para mim, na minha direcção.

vi-te pela primeira vez há quatro anos atrás, suponho que um só desses quatro conta.

Fomos mesmo amigos? Acaso sabias que o meu quarto nunca esteve arrumado? Que pode isso interessar agora?

Picture by Yannis Behrakis

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Isto promete

Vai uma birdie voar também para outros sítios e é logo apodada de miserável, de Eva e de pecadora. Ok que também é verdade que é "a mais completa"... mas mais completa quê? Eva? Miserável? Ou pecadora? De qualquer modo, meu estimado Adão, essa folhinha - ainda que desenhada por Rubens - está completamente fora de moda.
Que a Deusa nos ajude.

Chronos

É tarde. Demasiado tarde? O despertador assinala as cinco, doendo-lhe no corpo o pulsar daquele número. Não há razão para querer ser heroína.
No dia dos seus cinquenta anos, o relógio acorda-a no silêncio da contagem das cinco horas da manhã - ou será da tarde? Pressente o toque inaudível do tempo e repete: é tarde, é tarde, é tarde. Se calhar demasiado tarde, tarde.
Ou então é hora, hora, hora, hora.
Hora de olhar para trás e contabilizar o que não fez, o que não quis: o que quis e não fez.
Demasiado tarde? Bate as pestanas cinco vezes, os dois olhos a marcar-lhe a idade em dobro. Viveu de menos ou viveu demais?
Já passaram cinco minutos e continua deitada, imóvel; apenas a respiração marca os segundos e as pálpebras no movimento incerto. Acorda ou não? Ou simplesmente deixa-se dormir até novo bater das cinco (da tarde ou da manhã)?
É tarde, tarde, tarde. Duas vezes tarde.
Hora de olhar para trás e enumerar o que fez mas não quis fazer.
É tarde, tarde. Três vezes tarde.
Adormece. Bom dia. (ou boa noite?)

monossílabos obscenos

domingo, 18 de janeiro de 2009

"Oh Shit. Not you again."

É tudo uma questão de timing. E Sócrates, o Novo, achou por bem lançar a questão do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo no seu programa eleitoral. A mesma questão que não se punha há meses atrás, agora é hasteada, na esperança de um punhado de votos. E eu, que concordo em absoluto com esta questão, espumo de raiva perante uma tão descarada canalhice*.

*E não, não é melhor tarde do que nunca. Porque esta assunção tardia da causa tresanda a engodo. Mas eu sou assim, esquisitinha.

Doormat

Ser condescendente com a morte*

Um relógio (belíssimo relógio) que regista o tempo no sentido inverso.
A partir de um conto de F. Scott Fitzgerald, David Fincher apresenta-nos uma parábola da obsessão contemporânea com a inscrição do tempo no corpo, catedral amaldiçoada do existir.
É o velho sonho que remete para a procura de uma certa fonte da juventude que finalmente desembocou em alquimias de século XXI, com mulheres e homens que ao invés de envelhecerem digladiam-se diariamente com o registo temporal. Portanto, a premissa é muito simples: e se esse registo fosse inverso?
Não que o tempo não deva deixar a sua marca em nós (não?); apenas queremos que suavize essa passagem, que não nos arraste na decadência do minuto que implacavelmente passa, que não nos lembre que somos finitos, aproximando-nos cada vez mais ao pó através do corpo que diariamente se desfaz.
E assim surge diante de nós um homem ideal: um novo velho que progressivamente se transforma em velho novo. Um homem ao contrário, com uma temporalidade generosa perante o passar dos anos, mas nem por isso menos implacável. Um Benjamin aterrorizado com a possibilidade do rejuvenescimento, de mãos quase dadas com uma Daisy paralisada perante a inevitabilidade do (seu) corpo que envelhece. Em uma das deixas, Daisy afirma que estavam destinados a encontrar-se algures no meio do percurso, quando a coincidência dos corpos lhes permite o reconhecimento do gesto amoroso por algum tempo. Gesto que se interrompe, uma vez mais, pelos corpos mutantes de ambos que reclamam separação aos amantes.
A obsessão contemporânea pauta toda a narrativa e horroriza o espectador. Nada mais perturbante que o espreitar da demência no corpo de uma criança de sete anos, com um passado que se desvanece numa memória envelhecida e o sabor amargo que resta na certeza de que ainda que se engane o corpo e a imagem que dele se cria, a finitude não se engana e não se compadece perante a visão de um recém nascido com o conhecimento do mundo no olhar.

*Título surripiado a Heiddeger

Sublinhado

Mesmo que assolado por algumas angústias (confessadas em tom angustiado em caixa de comentários - vide o link do post abaixo), Funes continua inspirado.

Lullaby de Domingo



Here comes your W(h)o(a) "man"

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Desejo para 2009*

Que o Bartleby reactive um dos blogs, ou reabra algures um outro. Abandonar-nos completamente é que não.

*Já vamos a meio do mês e estas coisas pedem-se logo ao início, eu sei.

Casar com muçulmanos não é legal, Babalú!

Babalú: - Pepe Legal, casar com muçulmanos não é legal? Pepe Legal: - Não, não é mêmo legal... Mas, Babalú, para pensar estou cá eu!

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

How to deal with a feminist

Nunca dirigir-se-lhe com a expressão "man".

and the last but not the least....

Trilogia perfeita de cabeceira

A Maçã no Escuro, de Clarice Lispector e Amigo e Amiga: Curso de Silêncio de 2004, de Maria Gabriela Llansol. Estes são os magníficos livros que constavam da minha cabeceira até hoje ao início da tarde. Do primeiro já vos tinha dado conta. O segundo foi-me recomendado há pouco, pela mesma pessoa que me leu Clarice, pela primeira vez, há 9 anos. O terceiro chegou-me hoje, por artes mágicas de Morfeu. A Campânula de Vidro, de Sylvia Plath junta-se aos outros, depois de uma quase apoplexia. A má notícia (para mim, claro, que em rigor isto não interessa a mais ninguém) é que por enquanto tenho que trabalhar - garantir sustento para uma gata que, neste preciso momento, ressona a meu lado.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Mãos sujas

Já aqui o disse uma vez: não tenho qualquer complacência com as questões culturais que implicam a sujeição da mulher. Mas também não me parece justo que se estabeleça uma cisão de tal forma grave que nos justifique o inchaço de peito quando falamos em nós. Não estamos numa trama de desenhos animado em que os bons são claramente bons e os maus indiscutivelmente maus.
No que diz respeito a doutrinas religiosas, nenhuma pensa a mulher de forma justa; e logo aqui as relações a dois estão minadas por este intrincado religioso e cultural que determina e condiciona os papéis de um em relação ao e com o outro. Com justeza, posso pensar que o cristianismo - nomeadamente o catolicismo - tem efectuado um percurso longo e doloroso no sentido de estes padrões se alterarem. Mas está longe, demasiado longe do que se pode e deve esperar. E portanto, não se pergunte por quem os sinos dobram: afinal de contas, dobram por todos nós. (adulteração do texto de John Donne)


"O século XX ter-nos-á ensinado que nenhuma doutrina é, por si mesma, necessariamente libertadora, que todas elas podem derrapar, todas elas podem ser pervertidas, todas têm as mãos sujas de sangue: o comunismo, o liberalismo, o nacionalismo, cada uma das grandes religiões e mesmo o laicismo. Ninguém possui o monopólio do fanatismo e ninguém, por outro lado, tem o monopólio do humano.
Se se quiser lançar sobre estas questões tão delicadas um olhar novo e útil, é necessário ter, em cada etapa da investigação, o escrúpulo da equanimidade. Nem hostilidade, nem complacência, nem, sobretudo, a insuportável condescendência que parece ter-se tornado para alguns, no Ocidente e não só, uma segunda natureza."
Amin Maalouf, As Identidades Assassinas, p. 63

"Um monte de sarilhos"

No que diz respeito a confissões religiosas, a mulher está sempre tramada, não tenhamos ilusões. Somos sempre filhas de um deus menor; ou melhor, de uma deusa. Pequenina. Um outro departamento, para pessoas menos pessoas que as outras. Portanto, as declarações do Cardeal Patriarca soam-me a um apontar de dedo de um roto (vá, mais compostinho) a um esfarrapado.

Sublinhado duplo

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Ampulheta Funiana


Jacques Derrida
Jacques Derrida
Jacques Derrida
Jacques Derrida
Jacques Derrida
JD
Jacques Derrida
Jacques Derrida
Jacques Derrida
Jacques Derrida
Jacques Derrida

domingo, 11 de janeiro de 2009

SMS - 9 de Outubro de 2004

A mensagem desapareceu. Com as mudanças de telemóvel e os funcionários que me repetem monocordicamente que nada posso fazer, a mensagem de 9 de Outubro de 2004 desapareceu sem deixas rasto, a não ser o do post linkado. Outras também se foram, mas a perda de nenhuma me transtorna mais que esta; porque relembra-me o estarrecimento que senti. Um ano antes, Derrida havia estado em Coimbra. Na altura, (a falta d)o vil metal impediu a minha deslocação à cidade e recordo ter pensado, com alguma ligeireza, que teria outras oportunidades. Esse adiamento custou-me caro e terminou abruptamente a 9 de Outubro de 2004. Essa era a mensagem que, guardada durante anos, me recordava que o acto de adiar pode efectivamente matar-nos o sonho.

Em 2005 - e agora, em finais de 2008 ouço-lhe na voz o mesmo; recomenda-me que não adie mais, que não prolongue o universo do talvez, em que nada faço e muito desejo. Quatro anos depois, a mensagem (entretanto desaparecida) ganha nova força e este será provavelmente o ano em que darei o passo para deixar de adiar o que me espera. Entretanto, passaram-se oito anos e o medo não abrandou. O que significa que nunca desaparecerá e que nunca poderei esperar pela certeza de estar preparada. Estou quase lá. No reinício. Só falta o salto definitivo. É que depois, dificilmente há retorno. Apenas deixa de existir "e se".

Lullaby de Domingo

Para mim uma novidade, este álbum datado de 2000. Tem tocado muito por cá e tive sérias dificuldades em escolher que faixa aqui deixar. Outras virão, um domingo destes.



"I want the exact same thing but different"

sábado, 10 de janeiro de 2009

Generosidade e paciência: Post-it de Job


O Jorge anda a testar-me: ontem insultou Clarice, hoje insulta a Nina. Não sei quanto mais aguento.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Quanto maior é a crença, maior é a queda

(de Chagall)

"Creio no incrível, nas coisas assombrosas, na ocupação do mundo pelas rosas, creio que o amor tem asas de ouro. Ámen."

Natália Correia

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

O ano passado aconteceu, a semana passada também, a ver vamos o que acontece este ano

Em plena rua, ele obriga-a a entrar no carro enquanto a agride. Agarra-a pelos cabelos e insulta-a verbalmente, como se a violência física não fosse suficiente. Ela grita por socorro e suplica que chamem a polícia. Uma idosa ainda tenta abrir a porta do carro em que ele a enfiou, mas a porta está trancada e ele vocifera contra a senhora, enquanto continua a agredí-la. Arranca com o carro e nunca mais são vistos
Um dos trausentes anota a matrícula e telefona à polícia. Relata o que viu e fornece a matrícula anotada. A resposta do outro lado chega displicente e vergonhosa: que entre marido e mulher não se deve meter a colher, que para haver queixa só se a vítima a apresentasse (???), que o melhor era deixar a coisa por ali, até porque provavelmente tudo seria negado.

As queixas sobre este tipo de crime aumentaram no ano transacto. Resta saber quantas não chegaram a acontecer, em função do atendimento prestado aquando da tentativa de registo das mesmas. Quantas terão sido as afirmações bárbaras que acima descrevo?
A nova proposta de lei sobre a violência doméstica será entregue ainda este mês na Assembleia da República, depois de um ano negro: no final, a contabilização regista pelo menos 45 mulheres assassinadas pelos seus companheiros (ou ex companheiros). E no entanto, pelo menos um agente da lei ainda afirma, a um absoluto desconhecido que lhe dá conta de um crime, que entre marido e mulher (?) ninguém deve meter a colher e que o melhor é que a coisa se resolva entre eles.

Em tempos, ouvi alguém justificar este tipo de comportamento com o argumento mais absurdo que já ouvi: que está provado que muitas mulheres, cada vez mais, traem os seus companheiros durante o relacionamento amoroso. Queria a pessoa dizer que esta justificaria a agressão. Quando lhe perguntei pelos números inversos - ou seja, da quantidade de homens que traem as mulheres durante o relacionamento amoroso - a resposta foi a de sempre: que era diferente e que eu sabia (??) que era diferente.

Eu não sei de absolutamente nada. Apenas desconfio que com este estado de coisas, muito provavelmente 2009 seguirá as pisadas de 2008.

Lamento não poder fornecer o autor da imagem. Mas a verdade é que a obtive depois de uma busca pelo google e não havia qualquer referência quanto à sua origem.

O Evangelho Segundo Clarice

"Nenhum pensamento perturbava a sua marcha constante e já insensível, senão de vez em quando a ideia mal aclarada de que talvez estivesse andando em círculos."

Começo a leitura de A Maçã no Escuro. Andei a poupá-lo, como se fosse o derradeiro. Quis este livro durante tanto tempo que, apesar de o ter desde Novembro, deixei-o em pousio, admirando-lhe diariamente a capa que encerra o que está por ler. Esperei dois meses; é demasiado. Rasgo finalmente o desejo e mergulho na concretude da leitura. Para me perder, espero. É quando me perco (em Clarice) que geralmente encontro mais um bocadinho de mim.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Sublinhado

A importância das coisas e o Prelúdio de Rachmaninov que o acompanha.

Comunicado aos fãs


Chegou-me às orelhas que alguns dos meus fãs mais dedicados têm manifestado aborrecimento pela minha falta de notícias. Não desesperem meus queridos. Apenas atravesso uma fase de adormecimento compulsivo. Sou felino cansado do descanso do dia-a-dia. Ultimamente, posto-me nas almofadas, em vez de postar no computador; tem-me parecido mais produtivo e agradável. Mas não deixo de vos endereçar estas generosas palavras e de assegurar que não vos manterei sem notícias. Contudo, atentai no seguinte: por enquanto, mantenho-me de licença sabática, por isso recuso este tipo de mundaneidades.
Tenho escrito.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

O pagador de promessas


Como prometido, Mr. Lekker trouxe o chocolate do meu contentamento. E foi mais longe acompanhando-o com um chá principesco.

domingo, 4 de janeiro de 2009


Buscamos as palavras dos outros porque as folhas brancas perdem o sentido nas vírgulas da razão.
Porque não há melhor forma de dizer a vida que roubá-la aos que passam apressados por nós,
Os que a olham devagar não temem.

Ininterrupções

Morfeu é suspensão e metáfora.
Reencontramo-nos no intervalo de uma partida e de uma chegada, por entre dançarinos apressados no espaço de ninguém. O abraço da chegada - breve, saudoso - contrasta o abraço da partida - longo, apertado, mais uma vez e sempre precoce.
Trago na pele - e na carne - a saudade que já deixo de todos os Morfeus da minha vida, dos corpos que toquei e abracei por breves instantes nas últimas semanas, das cumplicidades reavivadas, alentadas pela presença física - que a presença fantasmática nunca deixou esmorecer. O acto de abraçar tornou-se-me um movimento perpétuo, acto de amor que testemunha as paixões da minha existência; foram tantos os abraços nestes últimos tempos que ainda me doem os ossos. E ainda bem.

sábado, 3 de janeiro de 2009

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Achoo

Já não serves, já não serves
Nunca mais, sapato preto,
No qual tenho vivido como um pé
Durante trinta anos, pobre e branca,
Mal me atrevendo a respirar ou a dar um Atchim.
Paizinho, tinha de ser eu a matar-te
Mas morreste antes de eu ter tido tempo -
Pesado como mármore, um saco cheio de Deus
Estátua lívida com um dedo do pé cinzento
Grande como uma foca de S. Francisco.
(...)
Sempre tive medo de ti,
Com a tua Luftwaffe, a tua lenga-lenga.
O teu bigode aparado
E o teu olho ariano, bem azul.
Homem-panzer, homem-panzer, Ó Tu -
Não Deus mas uma suástica
Tão negra que nenhum céu podia esgueirar-se por ela.
Não há mulher que não adore um fascista,
A bota na cara, o bruto
Bruto coração de um bruto como tu.
Estás de pé junto ao quadro preto, paizinho,
Na fotografia que eu tenho de ti,
Uma cova no queixo em vez do teu pé
Mas sem deixares por isso de ser um demónio, nem
O homem negro que
Mordeu o meu lindo coração vermelho partindo-o em dois.
Tinha dez anos quando foste enterrado.
Aos vinte tentei morrer
E voltar, voltar, voltar para ti.
Pensei que até os ossos me serviam.
Mas trouxeram-me de novo à vida,
E juntaram-me os bocados com cola.
E soube então o que devia fazer. Fiz uma réplica de ti,
Um homem de negro com ar de Meinkampf
E muito entendido na roda dos suplícios.
E eu disse sim, sim.
Portanto, paizinho, isto acabou finalmente.
O telefone negro está desligado da raíz,
As vozes deixam de achar o seu caminho.
Se já matei um homem também posso matar dois -
O vampiro que disse que eras tu
E que bebeu o meu sangue durante um ano,
Sete anos, se queres saber,
Paizinho, agora podes voltar a deitar-te.
Tens uma estaca nesse teu gordo coração negro
A gente da aldeia nunca gostou de ti.
Dança e bate o pé em cima de ti.
Sempre souberam que foste tu.
Paizinho, paizinho, meu sacana, acabou-se.
Sylvia Plath
(exemplar companheira de viagem)