Voltamos a ter um ano negro. 39 mulheres assassinadas, 11 "danos colaterais" e 38 tentativas de homicídio (uma delas já esta semana).
É a crise, dizem muitos/as. As pessoas andam muito mais agressivas por causa da crise. Mas esta questão, a da violência nas relações amorosas sempre foi um problema subjacente ao modo como nos relacionamos, com ou sem crise, com ou sem informação com mais ou menos punição.
A verdade é que continuamos a validar estes comportamentos de cada vez que procuramos justificações, de cada vez que chafurdamos nos contornos do crime à procura de motivos. Ela provocava, ela estava a pedi-las, ela também nunca se foi embora continuam a ecoar mais alto que ele matou-a.
2 comentários:
Concordo com quase tudo, excepto com o uso da expressão violência nas relações amorosas. A violência nas relações amorosas, quando ocorre, é no contexto de relações sado-masoquistas. Enquanto violência consensual e dentro dos limites da segurança de cada um dos envolvidos voluntariamente nela, é assunto privado em que ninguém tem o direito de se meter.
Quanto à violência doméstica em sentido mais convencional, não vejo como possa desenvolver-se no contexto de relações amorosas.
Entretanto, tenho um problema para si, um problema real que acompanhei e que tenho a certeza que é apenas um exemplo entre milhares:
O marido espanca regularmente a mulher com quem vive. Não há testemunhas. O casal não tem filhos e os vizinhos mais próximos moram relativamente distantes. Um dia, cansada da violência de que é vítima, a mulher apresenta queixa. O Ministério Público acusa o marido. Dias mais tarde, a mulher aparece a dizer que quer desistir da queixa. Explicam-lhe que o crime do marido é público e que ela não pode desistir. No dia do julgamento, a única prova disponível são as declarações da mulher. Esta declara que não senhor que o marido nunca lhe bateu e que a queixa que fez, a fez porque tinham discutido por causa dos ciúmes dela que suspeitava que ele tinha uma amante e que as nódoas negras que apresentava quando foi ao Instituto de Medicina Legal eram fruto de ter caído nas escadas da casa. Em julgamento, o juiz não pode valorar a prova recolhida em sede de inquérito. Teve, naturalmente, que absolver o marido. Um destes dias é possível que ele a mate.
O que sugere?
O caso que o Funes descreve não é único, nem sequer é raro. A violência física geralmente aparece depois de uma outra muito mais insidiosa e incapacitante. Por isso essa mulher recua. E sim, provavelmente vai acontecer novamente, com uma escalada ainda maior. O acompanhamento que essas situações exigem é insuficiente. Uma denúncia externa, na minha perspectiva seria o mais eficaz, aquando de uma agressão.
Mas o Funes que faria?
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