domingo, 27 de julho de 2008

A propósito de uma conversa ao longo do jantar

Chema Madoz

Ao longo do jantar de bloggers, foram múltiplos os assuntos colocados em cima dos pratos. Já nem sei muito bem como, chegamos à leitura e ao que conseguimos ou não ler. Como o tema me é querido. trago a discussão aqui para o blog. Sem pratos.
Saramago é, para mim, uma melancolia. Gostava genuinamente de o conseguir ler, mas há algo em mim que o interdita. Tanto quanto já pude ouvir sobre os seus livros, há alguns conceitos que considero geniais. Simplesmente, não consigo ler-lhe as entrelinhas. Pela forma como espraia esses conceitos pelo texto, Saramago é-me ilegível.
O mesmo já não acontece com Miguel Sousa Tavares. Como já tive a oportunidade de explicar anteriormente, as minhas razões para a recusa da leitura de MST são absolutamente irracionais: o homem irrita-me solenemente. Nem precisa abrir a boca. A postura corporal e os trejeitos de lábios são suficientes para me provocarem náuseas. O vaidosão da opinião contaminou completamente a minha visão sobre a sua escrita, pelo que nem consigo pegar num dos títulos dele para folhear em plena livraria. Desleitura antes da leitura, portanto.
Por outro lado, também tenho as minhas paixões assolapadas. Clarice Lispector é uma delas. Foi-me apresentada numa algo distante aula de Filosofia Contemporânea (quiz endereçado a Sancho: quem terá sido?). Ninguém como ela para me atingir com as palavras. Irónico que eu, que não consigo ler quase nada em português do brasil, eleja uma brasileira como uma das escritoras da minha eleição. A outra é, evidentemente, Virgínia Woolf (o nome deste blog assim o denuncia).
A escapar a esta catalogação, está Patricia Dunker. Dela, apenas li um pequeno livro, A Sombra de Foucault, que devorei. Difícil de encontrar nas livrarias, tenho o meu completamente rasurado, com as páginas a despenarem do manuseamento. Na verdade, a minha adoração por este pequeno livro é algo ridícula: não está maravilhosamente escrito. Mas tem passagens sublimes e essas bastam-me.
Passo a bola para o vosso lado: quem é o autor(a) da vossa eleição (e já agora, que livro)?
E quem nunca conseguiram ler, apesar de inglórios esforços?

17 comentários:

Blueminerva disse...

Minha queria WOAB,
Em Saramago, estamos de acordo. Demasiado elitista para mim.
No que toca a MST, também estamos de acordo, pois não consigo desassociar o homem do escritor. Aqueles maneirismos esquizofrénicos e facciosismo exacerbado e cego que lhe é típico são de facto insuportáveis!
Tinhas referido Clarice Lispector no jantar... confesso que não a conheço, mas vou tratar de pesquisar.
Quanto a autores de eleição, Fernando Pessoa é para mim, referência intemporal da literatura. O Livro do desassossego está sempre na cabeceira.
Beijocas

Blueminerva disse...

Ah! Esqueci-me de referir que já tentei ler Saramago por duas vezes e o mesmo livro "Ensaio sobre a cegueira" e ao cabo de pouco mais de 10 páginas, fechei o livro e voltei a colocar na prateleira. Ainda lá está.

Woman Once a Bird disse...

Blue:
Ao escrever este post tive algumas dificuldades; primeiro, porque reduzi as minhas preferências a duas. Segundo, porque outras impossibilidades de leitura tenho, sendo que as referidas são as mais fortes.
Referes Fernando Pessoa. Para mim, a Tabacaria é absolutamente incontornável - aquele começo esmagador.

Ceridwen disse...

Recordo o vómito que tentava controlar enquanto lia algumas passagens do Ensaio sobre a Cegueira. Algumas eram tão fortes ao ponto de desencadearem em mim sensações físicas. Sentia convulsões que me eram particularmente difíceis de controlar. Lia-o no metro, a andar, na cantina, nos cafés. Por vezes estancava no caminho, tinha que ler aquilo duas vezes, era tudo tão terrível, etnão procurava um banco, ou encostava-me à parede mais próxima. Controlava as lágrimas, levava a mão à boca a exprimir o horror. Não por o achar mal escrito, mas foi-me doloroso ler, por descrever um cenário longínquo da realidade e tão perto da humanidade. Por ele (o autor) conseguir das às personagens - somente com as palavras - tudo que precisava para imaginar aquelas pessoas, naqueles espaços - e a falta deles. Para mim é um livro incontornável. Gostei de outros dele, mas apesar de ter uma adoração especial pelo Memorial do Convento, O Ensaio sobre a Cegueira marcou-me de forma inefável. Enfim. É, sem dúvida, das minhas obras favoritas.
Quanto ao MST... nada a dizer. Amei-o enquanto director e repórter da GR, tanto que quando veio o Francisco Viegas deixei de assinar a revista. Depois, não sei se foi ele, se fui eu.... passei a desprezá-lo. Será bom na escrita de certeza, mas a presença televisiva dele provoca-me demasiado asco para sequer ter curiosidade em ler algum dos livros dele. Puro preconceito meu, portanto. O último que li que devorei (há muito tempo que não sentia tal prazer na leitura) foi A Sombra do Vento, o qual recomendo vivamente. É, pura e simplesmente, divino!

António Conceição disse...

Vamos lá a ver: Saramago é um escritor. Fraquito, muito limitadito, muito longe do génio que ele disparatadamente se julga ser, mas, apesar de tudo, um escritor.
Miguel Sousa Tavares, ao contário, não é escritor. Escrevinha uns livros, mas isso, nos dias que correm, até a Rebelo Pinto, a Carolina Salgado ou um concorrente do big brother de cujo nome não quero lembrar-me fazem.

Blueminerva disse...

A Sombra Do Vento de Carlos Ruiz Zafón é um mistério literário passado em Barcelona da primeira metado do século XX, desde os últimos esplendores do Modernismo até às trevas do pós-guerra. É um livro maravilhoso, com uma narrativa cativante. Um inesquecível relato sobre os segredos do coração e o feitiço dos livros.
Também recomendo vivamente.

Anónimo disse...

De eleição um português e um estrangeirão:
Vergílio Ferreira - Manhã Submersa.
William Faulkner - O Som e a Fúria

Esforços inglórios - alguns, mas o principal: Ulisses, J. Joyce.

Woman Once a Bird disse...

Vou anotar a recomendação, Ceridwen e Blue.

Funes:
O homem é identificado como escritor. Saramago tentei ler, mas no que diz respeito a MST nem me aproximei dos livros, portanto nada posso atestar.

Jorge:
Li a Manhã Submersa, mas não será um livro de eleição (para mim, claro). Faulkner nunca lhe peguei. Já o Ulisses, foi deposto. A par com o Em Busca do Tempo Perdido. Só tenho o primeiro volume porque dada a falta de entusiasmo na leitura (que não terminei) julguei ter outras prioridades.

Anónimo disse...

"O Memorial do Convento", "O evangelho segundo Jesus Cristo" e o "Levantado do chão" de Saramago são para mim verdadeiras obras primas!

António Conceição disse...

Já agora:

Tenho a "Sombra do Vento" há dois anos na minha mesa de cabeceira e ainda não o consegui ler. Vejo-o tão elogiado que suspeito ser detestável. Por outro lado, a moda de Barcelona irrita-me solenemente.
No fundo, receio que produza em mim o efeito que teve "A insustentável levez do ser", do Kundera, um livro miserável que, à época, não houve quem não se derretesse em elogios ao mesmo.
E, no entanto, tem tudo para ser um livro magnífico.

PS- tenho a impressão que a frase "...muito longe do génio que ele disparatadamente se julga ser", que deixei no meu comentário anterior, não faz de mim lá grande escritor.

Woman Once a Bird disse...

Mas então porque o mantém à cabeceira? Convenhamos, é um local embaraçosamente íntimo para mantermos algo que nos parece detestável.

Sancho Gomes disse...

Sem nomes, não é? ;)


Vou responder ao teu repto lá no antro dos conspiradores. Mas não esperes nada antes de quinta-feira. Até lá, há muito mais a viver para além da blogosfera...
bjs

Sancho Gomes disse...

Quanto ao "A Sombra do vento" foi efectivamente uma das boas descobertas. E, tal como o Funes, há muito que o tinha encostado numa estante, com algum preconceito em lê-lo.

Unknown disse...

Saramago é dificil de ler, alguns livros são complicados de perceber, a própria forma de escrever deixa-me quase sem fôlego, mas devorei, numas férias, o Evangelho segungo jesus Cristo e até hoje não consegui ler melhor.
São gostos, Senhor são gostos...

António Conceição disse...

O meu problema, cara WOAB, o meu grande drama, é esta dúvida que me corrói por dentro: e se, apesar de todos os elogios, "A sombra do vento" é mesmo bom?

Anónimo disse...

A Nefertiti não faz um post há imenso tempo. Estou a reclamar!

Woman Once a Bird disse...

Reclamação registada. A visada que se pronuncie. ;)