"Tudo terá de ser novo, e todos temos medo. E o problema da mulher, no meio disto, não é o de perder ou ganhar, é o da sua identidade. Que nesta sociedade, muitas coisas lhe são gratificantes, sem dúvida; mas que a mulher (e o homem) não tem consciência de como é manipulada e condicionada, ainda oferece menor dúvida. A repressão perfeita é a que não é sentida por quem a sofre, a que é assumida, ao longo de uma sábia educação, por tal forma que os mecanismos da repressão passam a estar dentro do próprio indivíduo, e que este retira daí as suas próprias satisfações." "Onde reaprender a ser, onde reinventar o modelo, o papel, a imagem, o gesto e a palavra quotidianos, a aceitação e o amor dos outros, e os sinais de aceitação e amor? Bem sei, (...), de que te queixavas, do que eras incapaz: de inventares sozinha a mãe, a heroína, a ideologia, o mito, a matriz, que te pusesse espessura e significado perante os outros, que até aos outros abrisse caminho, se não de comunicação, pelo menos de inquietação. (...) Onde reinventar o gesto e a palavra? Tudo está invadido pelos gestos antigos, e nós próprios, e nós mulheres que pretendemos revolucionar até aos ossos, até à medula. Olhando para ti, (...), vejo, sem querer e como todos (...). Assim te sou hostil apesar de irmã, nesta época que muitos dizem de igualdade, e onde o trabalho da mulher já vale dinheiro (pouco) e a palavra da mulher já é ouvida (e mal entendida)."
Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta, Maria Velho da Costa Novas Cartas Portuguesas
1 comentário:
Excelente selecção! Sobretudo para as situações não tão gritantes quanto a violência (de género) - que falas acima.
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