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O que me choca mais não é a imagem da capa da Visão. Choca-me mais a falta de sapiência das pessoas face ao que é e deve ser o Fotojornalismo e o dever de um fotojornalista. Para os Madeirenses que viveram a tragédia consigo entender que a imagem choque e que até o facto de não gostarem de a ver publicada na capa da Visão. Chamar-lhe sensacionalista, voyeurismo e outras coisas do género é que não só não consigo admitir como me entristece profundamente, talvez por ser precisamente a minha profissão. Porque não se viram contra a ficção jornalística com que somos bombardeados diariamente em certos canais de televisão? Porque não se viram contra as revistas cor-de-rosa que atentam diariamente contra a privacidade e o bem estar das pessoas destruindo muitas das vezes famílias inteiras... Não estamos perante uma foto de paparazzi e aqui não há nem pouco de margem ao sensacionalismo!!! Cabe sempre ao fotógrafo decidir em milésimos de segundo se deve ou não fazer a foto, no entanto perante uma tragédia cabe ao fotógrafo informar e mostrar a realidade ao mundo. Posso garantir que se esta foto e outra muito semelhante, captada por um outro fotógrafo da agência AFP, em que é retirado um corpo de um carro, não tivessem chegado à comunicação social do continente e aos jornais de todo o mundo, creio que nunca ninguém que não vivesse na Madeira teria tido a real dimensão do que foi a tragédia. Chama-se a isto realidade... Chama-se a isto Fotojornalismo. Um estilo de vida que na realidade poucos conhecem mas que é digno, ético, incorruptível e solidário! Se isto é uma verdade absoluta inerente à profissão? É. Se todos os fotojornalista se regem por estes valores? Não. Mas quando assim é percebe-se e nunca lhes deveríamos chamar fotojornalistas.
Quanto ao facto do fotógrafo ter realizado a foto tenho a profunda convicção de que qualquer bom fotojornalista com valores o teria feito, sempre respeitando a família, o corpo, os madeirenses e os seus próprios princípios. Parece-me claro e indiscutível! Vivemos num país que ainda é um pequeno paraíso e quando não existe uma abertura da sociedade portuguesa aos jornais e revistas internacionais percebe-se que isto choque. No entanto as grandes agências de referência do Fotojornalismo fazem diariamente fotos de horror e tragédia bem mais marcantes do que esta. Fotos que são publicadas nos melhores e mais conceituados orgãos de comunicação social mundial. Quanto ao facto de a foto ter sido escolhida para capa da Visão é outra história ainda que com os mesmos contornos. As fotos são enviadas para uma redacção que analisa as mesmas. Os Directores e Editores têm a responsabilidade e o dever de realizar opções e escolhas complicadas. Por isso é que estão nesses cargos. Se foi para vender?! Quem disser que não foi para vender mente, porque qualquer publicação quer vender, no entanto não acredito e não quero acreditar que tenha sido a única ou a razão mor de tal decisão. Informar, passar a dimensão real da tragédia, "abanar" a consciência dos políticos e de todo o povo para que se unissem e fossem solidários teria sido a razão mor pela qual eu a teria publicado.
Mesmo não conhecendo aproveito o blog para solidarizar com a família da vítima da foto e com o povo da Madeira. Não felicito o fotógrafo ou a Visão, porque não acho que se devam laurear. Vinco porém que foram profissionais e fico feliz por terem desempenhado o seu trabalho com coragem até ao fim sem quebrar perante possíveis pressões que terão existido.
Os Madeirenses tem uma força interior invejável dentro deles e são exemplo para todos em muitas áreas. Espero que consigam ter com o passar do tempo a capacidade para ver a foto de outra maneira e que se coloquem pelo menos do outro lado. Se esta não tivesse sido feita, teriam as ajudas chegado da mesma maneira? Teria o povo de Portugal Continental e de todo o mundo percebido a real dimensão da tragédia?
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