sábado, 2 de setembro de 2006

A Sopa da Mafalda


A cena começou invariavelmente da mesma maneira. Li este post e comentei o que me pareceu óbvio. O Funes respondeu com este onde expôs metodicamente os seus argumentos, especialmente para mim e para a Maria Papoila, para que evite aproximar-se de uma loja que venda trapos e, percebi eu agora, que venda sapatos. Ora, não posso deixar de retribuir a gentileza. E depois de ler atentamente a explanação, aqui registo as minhas pequenas reflexões. No final do post, fiquei com o velho travo a engodo. A máxima utilizada pelo camarada Funes é também utilizada pela maior parte (friso, maior parte, já que alguns começam a romper a regra) dos esposos após meados do século XX, pelo que não constitui novidade.
Desde que a mulher começou a fincar o pé e a requerer partilha de tarefas na casa que é deles (casal - não só dela, portanto), o homem percebeu (ou pelo menos alguns perceberam) que o velho tabefe, seguido de "cala-te e faz" já não resultava (em grande parte dos casos, salvo infelizes excepções). É que depois de algumas tentativas pela velha cartilha, casos houve em que as moças puseram-se porta fora e aí... nem metade; ficavam todas as tarefas enfadonhas por fazer. Daí a urgência em remodelar a estratégia. Era preciso inovar, foi preciso progredir.
Depois de aturada pesquisa, reinventou-se a noção de homem como o incapaz de serviço. A História demonstra que a táctica resulta. Primeiramente, o "Cavalheiro Jones" em Busca da Empregada Quase Perdida, tomou o exemplo dos escritos ditos sagrados. Reparou que os mesmos defendiam que o pecado do homem era, na verdade, culpa da mulher e que a única salvação da mulher (cristã), residiria então no seu recato, a fim de preservar o homem da tentação que o seu corpo suscitava; na verdade, um autêntico apelo à misericórdia feminina quanto à fragilidade confessada do masculino, no que diz respeito ao domínio do desejo. Ora, o investigador moderno não pretende uma mulher recatada, esmagada pelo peso da culpa do desejo masculino. O pecado já não mora aqui. Mas o investigador moderno astutamente agarrou-se à ideia do apelo à misericórdia feminina quanto à fragilidade confessada do masculino. E que melhor argumento para o escape às tarefas necessárias, mas enfadonhas do dia-a-dia? E vai daí que o conceito vingou e propagou-se à boca pequena… - Claro que lavo a loiça ( e pelo caminho parto metade, que é para aprenderes que não tenho jeito para isto). – E a companheira, confiante na inépcia da sua cara metade, erra quando pela primeira vez cede e solta um “Deixa que eu faço.” A partir daqui, está tudo perdido. Entrou em campo a velha e irreflectida misericórdia feminina.
O que a mulher tem que perceber é que um homem que tem capacidade para aprender, que mantém um escritório, um emprego, certamente consegue lidar com uma data de pratos e talheres… ou com a confecção de um jantar ou, aligeiremos a fasquia, lidar com uma simples aquisição de umas calças ou um par de sapatos.
É deixar partir pratos durante uns tempos; tal como os miúdos, depois do berreiro, acabarão por comer a sopa. Faz-lhes bem.

13 comentários:

Anónimo disse...

se parte muita louça, compra-se de pratos de plástico... se não tem jeito, adquira-o!!
Digamos que eu não tolero a atitude macho-chefe-preguiçoso! Nem como amigo, quanto mais como companheiro!!
excelente texto (como sempre!).

rps disse...

Eu lavo a louça sem partir nada, cozinho, arrumo roupa, não a deixo espalhada pelo chão, limpo casas de banho, só não passo a ferro. Contudo, comprar roupa e sapatos é-me penoso. Sempre que posso, neste campo, opto pelo recurso aos bons ofícios maternos e a outros, quando há condições.

António Conceição disse...

Cara Woman,

Tomando cmo leit motiv um dos meus post, a Woman arranca para uma cruzada anti-machista que eu não sei se me visava atingir.
Se visava, passou ao lado.
Não porque eu não deva ser considerado machista. Isso não me compete a mim avaliar, evidentemente. Mas porque nunca seria capaz de uma estratégia de partir pratos, para me escusar a lavar a loiça. Sou a pessoa menos estratega que há no mundo e o que faço, faço-o sempre frontalmente e sem reserva mental. É um dos meus grandes problemas na advocacia, de resto. Nunca jogo com cartas escondidas.
Isto dito, o meu post não era sobre tarefas domésticas. Era sobre o ódio que eu tenho à compra de roupa e de sapatos.
Odeio roupa nova. Odeio ainda mais sapatos novos. Só começo a gostar da roupa, quando ela fica coçada, e dos sapatos, quando eles estão cambados. Do mesmo modo, abomino até ao vómito comprar roupa e sapatos.
O meu comportamento não será vulgar, admito. Mas não havia no meu manifesto contra a compra de roupa nenhuma estratégia de criar qualquer tipo de misericórdia feminina sobre a minha pessoa. Eu nunca pedi à minha mulher que me comprasse roupa ou que me acompahasse nesse odioso exercício. Pelo contrário, preferia mil vezes que ela o não fizesse. Cumpria em cinco minutos um suplício que assim me leva duas horas.
O que o meu post dizia era apenas que, na minha visão do mundo, quando vou comprar roupa PARA MIM, acompanhado pela minha mulher, sou eu que lhe faço um favor a ela. Não o contrário.
Sinceramente, sem cair em erros lógicos graves, não vejo onde possa estar o machismo deste pensamento.
A não ser que se raciocione assim:
1- Ele odeia comprar roupa.
2- Mas ele precisa de roupa socialmente adequada, sob pena de ficar profissional e comunitariamente excluído.
3- Ele não sabe escolher roupa socialmente adequada,
4- nem faz qualquer esforço para aprender.
5- Ela também odeia comprar roupa,
6- Mas aprendeu a escolhê-la,
7- E sacrifica-se, acompanhando-o.
8- Ele não só não lhe agradece,
9- Como ainda acha que lhe fez um favor a ela.
LOGO:
ELE É UM MACHISTA.
Acontece que as premissas 3, 4, 5 e 7 são falsas e, consequentemente, a conclusão não se impõe a partir delas.

Woman Once a Bird disse...

Tem toda a razão, Funes. Tomei o seu post como leit motiv, mas foi só isso. Simplesmente, o seu post foi um ponto de partida para outras questões que me apeteciam desenvolver. E por isso, ao longo do post não particularizei... bem pelo contrário. Por isso, não leve a peito esta minha "cruzada".

Sancho Gomes disse...

Tu compreendes bem a mente do macho! Começas a ser perigosa;)

SG

Anónimo disse...

amiga, gostei muito do texto! tens muito humor! e... eu não acredito em machistas, mas que os há, há! Eles "andem" aí!:»

Woman Once a Bird disse...

Só por causa das tuas botas... ;)
Temos que combinar café. Só hoje tudo amainou... Tenho andado num rodopio surreal. Sabes que mais? Fiquei na Terra do J.A...

Anónimo disse...

Olá,

A irmandade do café está à tua disposição, menos ao fim-de-semana. Quando poderes, manda-me uma mensagem para combinarmos...

PS: Logicamente que há outros assuntos alvo de discussão, mas neste caso tudo se resumia a vestuário e lides do lar...

His_tory

Anónimo disse...

Olá WOAB, tudo bem?
Em resposta a este teu post anti-macho devo dizer que, infelizmente, conheço algumas dessas ricas prendas. E a tua descrição assenta-lhes que nem uma luva. Diga-se de passagem que a culpa é, muitas vezes, das mãezinhas e das mulherzinhas que lhes põem maus costumes. E, então, é vê-las na cozinha e pela casa toda com a esfregona às costas, enquanto o macho enterra o cu no sofá, a unhaca no comando da tv e a boca na cerveja, coçando, de vez em quando, as partes, (que macho que se preze coça-as sempre), cuspindo as cascas dos amendoins para o chão (que a gaja tem que se manter ocupada), pondo as patas em cima da mesa da sala e largando um traque ou um arroto de vez em quando, que a casa tem que se manter ruidosa e perfumada… E todos aqueles que, por inferioridade masculina, mencionam que ajudam na lida doméstica e que gostam de partilhar as tarefas só podem ser maricas, invertebrados ou cornos mansos…
Enfim, abomino tais seres e, apesar de também pertencer à facção masculina, não me porto de tal forma… Adoro cozinhar, limpo o meu quarto e a cozinha, lavo loiça e passo a ferro (embora não tenha lá muito jeito)… E não acho que isso me torne menos pessoa do que aquilo que sou… Abaixo esses coirões!!!

P.S. – Ficaste na minha terra? Mas pensei que tivesses ficado na zona A… Ficaste perto do teu museu regional favorito ou mais longe, onde Judas perdeu as botas??? Beijocas… J.A.

Woman Once a Bird disse...

Fiquei fora do mundo... ;)

Anónimo disse...

Não te preocupes... Não é assim tão mau. Pelo menos tens ar fresco e paisagem. Mas prepara-te que os invernos ainda são mais frios que os daquele vale entre montanhas que frequentaste no ano transacto. Se tiveres tempo e vontade, quando passares pela minha terra apita...
Beijinhos, J.A.

Woman Once a Bird disse...

Acho que percebeste mal. Para mim, fora do mundo é o Centro das Artes, que vai ser meu vizinho. Tenho a certeza que será mais quente.

Anónimo disse...

Ah... Pensei que tinhas ficado mais longe... Quente, de certeza que sim, mas mais frio a nível de relações humanas... Já lá estive e detestei... Mas, isso sou eu, que por cá vivo e conheço algumas das prendas que por lá pairam... Mas também há gente boa... Tenho lá alguns bons amigos... Boa sorte...
J.A.