sexta-feira, 1 de setembro de 2006

Odisseia aos Armazéns do Carmo

A minha adolescência, como a de muitos (ou mesmo da maior parte), foi uma fase complicada... carreguei um fardo nada fácil que foi o de ser filha de uma professora da escola que frequentava, o que me conferia o "direito" (na visão do conselho directivo, pouco pedagógica e social da altura) a pertencer às primeiras turmas, “aleatoriamente” preenchidas por filhos de professores, médicos, advogados, etc., etc. Ora, todos os dias confrontava-me com uma realidade diferente da minha e inatingível, já que a minha mãe pertencia à "classe" dos professores, sim, mas não tinha o poder de compra que os pais dos meus colegas teriam. E é neste cenário que surge o dilema das marcas de roupa a utilizar: enquanto os meus colegas desfilavam as suas calças Levi's, Charro e afins, as suas camisolas Lacoste, Benetton, etc. e ainda as sapatilhas All Star, Nike e Adidas eu, rezando para que passasse despercebida, revestia o meu corpo com peças de marca desconhecida dos....Armazéns do Carmo. Ora, passo a explicar para quem não sabe, os Armazéns do Carmo é um estabelecimento comercial, muito bem localizado na urb, de produção em série de todas as peças de vestuário possíveis e imaginárias, bem como de roupa para o lar, dispostas em gigantes cabides ao longo do espaço físico e que os clientes manuseiam para escolherem a peça desejada (uma espécie de feira com tecto e paredes), peças estas que não iam além dos 5 contos (na altura), razão pela qual terá sido uma alternativa bem apelativa para os meus pais. Pior do que usar estas roupas na escola (algo que tentava disfarçar fugindo das conversas cujo tema seria marcas de roupa e afins...), era o pesadelo de saber que tinha de entrar e sair do recinto para efectuar uma compra e ser avistado por um dos meus colegas de escola, algo que exigia de mim uma estratégia rápida e eficaz para isso não acontecer: a entrada era rápida, sem olhar para trás; à saída procurava, no entanto, acelerar o passo e inclinar o meu corpo de forma a, se por acaso alguém conhecido me visse, tivesse a sensação que não ia a sair da bendita loja, mas que já circulava no passeio vinda de um outro lugar qualquer! Os anos passaram e hoje sei que o que procurava estava longe de serem as marcas tão aclamadas, mas sim a identificação com um grupo no qual estava inserida, a procura da minha própria identidade, enfim...o meu lugar no (naquele?) mundo e os afectos que, na altura a moeda de troca parecia ser, numa ilusão própria da idade, o corresponder às expectativas dos outros. Graças aos meus pais, por me terem levado, inclusive, aos Armazéns do Carmo, com o passar do tempo foi-se a forma e ficou o conteúdo: não faço questão das marcas, mas sim dos afectos, que dou e recebo, conquistados, merecidos. E hoje... são o centro do Meu mundo!

5 comentários:

Anónimo disse...

custa-me dar muito dinheiro por um trapo! Nunca fui exigente no vestir... Não ligo mesmo nada às etiquetas, aliás, elas até estorvam, corto-as sempre!! Mas, quando andava na escola, adorava que meias calças fossem sempre da mesma cor da camisola!! Ficava desgostosa quando não era possível!!

Anónimo disse...

...nefertiti

Vénus disse...

sim, lembro-me dessa moda também ;)

Woman Once a Bird disse...

Sim, os afectos são a grande questão. E a verdade é que não tens razões de queixa, mesmo com uma adolescência ensombrada por "Armazéns do Carmo".
Mas não se recusa uma ida à AbaLarga, pois não? ;)

Vénus disse...

isso são influências de outras paragens... vou por arrasto! Mas não faço disso uma grande questão na minha vida, nem nas minhas vestes....