1.º Ato
Amante da palavra confessa, sou surpreendida com Cisne Negro de Darren Aronofsky. Não conheço nenhum dos seus filmes e já aqui confessei a minha quase insensibilidade para a realização. Apreendo-a num todo, como se fosse a malha invisível daquilo que realmente me interessa: o argumento e os diálogos. Mas este é um filme extremamente visual, num registo em que as palavras apenas suportam a mimética, real protagonista da película. E a música, a relembrar-nos o óbvio acerca da genialidade de Tchaikovsky.
Amante da palavra confessa, sou surpreendida com Cisne Negro de Darren Aronofsky. Não conheço nenhum dos seus filmes e já aqui confessei a minha quase insensibilidade para a realização. Apreendo-a num todo, como se fosse a malha invisível daquilo que realmente me interessa: o argumento e os diálogos. Mas este é um filme extremamente visual, num registo em que as palavras apenas suportam a mimética, real protagonista da película. E a música, a relembrar-nos o óbvio acerca da genialidade de Tchaikovsky.
2.º Ato
Este é um filme suportado inteiramente pela forma como é filmado e pelos desempenho dos seus protagonistas, com Natalie Portman à cabeça. A cena inicial é absolutamente premonitória de como nos colaremos a Nina, como respiraremos com ela (e quase por ela), como também nós sentiremos o colete de forças que a sufoca. Tal como a protagonista, a dissociação é de tal ordem que não conseguimos destrinçar a realidade do assustadoramente onírico.
O filme é absolutamente claustrofóbico. Desde o momento em que Nina é tocada pelo seu Rothbart (na figura de Thomas Leroy, o encenador e mentor e que também podia ser Mefistófeles) até ao momento em que cede lugar a Odile, filha das exigências de Thomas Leroy, sustemos a respiração para suportar a espiral da dolorosa e demente transformação, juntamente com a protagonista. E no final, finalmente respiramos. Ou não.
3.º Ato
Odete ou Odile, ou também Eva ou Lilith, a dualidade de papéis que é exigido a esta mulher, à mulher, a todas as mulheres. Metade Eva, metade Lilith, no fio da navalha, nem demasiado Lilith, nem demasiado Eva, um pouco Odete e qualquer coisa de Odile.
6 comentários:
:)
Adoro o realizador. Aconselho-te a ver Pi. http://www.imdb.com/title/tt0138704/
A minha noite de ontem foi dedicada a isto: http://en.wikipedia.org/wiki/Caterpillar_(film)
Fantasmas da guerra, fantasmas do casal e a história de como as mulheres deveriam honrar o Império (poucas pessoas podiam ver isso nesta estória).
Conheço toda a obra do Aronofsky... é um dos meus eleitos, no que toca a cinema. Se achaste "Cisne Negro" claustrofóbico, nem sei o que dirás de PI. No entanto, e apesar de gostar de todas as obras do Aronofsky, devo dizer que "The Fountain" atirou-me ao chão como poucos.
É verdade. o PI é uma maluquice de claustrofobia. Foi o primeiro filme do Aranofsky e é mais ingénuo, mais confuso, pouco orientado. E o Black Swan vem, no fundo, galvanizar a sua obra num único momento sublime.
Mas, em relação a Odete e Odile devo confessar que já discordo. Não é bem discordar. Vejamos: a minha percepção levou-me para outro campo, onde Odete não pode ser Odile, porque não faz parte da sua natureza. Pode sim, relaxar (no PI, o professor do Cohen está sempre a dizer-lhe que ele precisa de relaxar, há ali um padrão). Mas ser o que não se é envolve um esforço desumano que nos prejudica, como se viu. Por isso, não acho que haja um pouco das duas, mas apenas uma em excesso.
Eu sei que discordamos. Percebi quando li o teu texto. Mas aí é que está; na minha forma de ver o filme, ela também é Odile. Só que as camadas que foram construidas sobre essa Odile arqui-originária, pela mãe, pela disciplina, pela necessidade de ser menina até muito tarde (a infantilidade é preciosa num universo como o do Ballet, em que a aparente fragilidade corporal é graciosa), sufocou Odile, criando Odete (e durante muito tempo apenas Odete). (Também poderiamos falar de Apolo e Dionísio). E Odete adormeceu até ao dia em que começou a ser invocada e aí exigiu vingança.
Sim, concordo com essa perspectiva. Ou seja, do sufoco é que nasce a raiva, o lado verdadeiramente negro. Sem dúvida.
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