Depois de cada guerra
alguém tem de fazer a limpeza.
As coisas não se limpam
a si próprias, afinal.
Alguém tem de afastar os escombros
Para a berma da estradas,
Para que as carroças com os cadáveres
Possam passar.
Alguém tem de meter-se
por entre a lama e as cinzas
por entre as molas dos sofás
por entre os vidros partidos
por entre os farrapos ensanguentados.
Alguém tem de arrastar a trave
Que escorará a parede,
Alguém tem de por o vidro na janela
E colocar a porta nos gonzos.
Nada disto é digno de ser fotografado
E demora anos.
As máquinas fotográficas partiram já
Para outras guerras.
As pontes têm de ser reconstruídas
E as estações ferroviárias também.
As mangas das camisas ficarão rotas
De tanto serem arregaçadas.
Alguém, vassoura na mão,
Se lembra ainda de como foi.
Outro alguém escuta, acenando que sim
Com a cabeça
Mas já outros, ali perto
Acham tudo aquilo um pouco maçador.
De vez em quando alguém
Desenterra ainda numa moita
Um velho argumento enferrujado
E lança-o na lixeira.
Os que sabem
o porquê e o como
vão ceder lugar
aos que pouco sabem.
E aos que sabem menos ainda.
E por fim mesmo nada.
E na erva que vai crescer
Sobre as causas e os efeitos
Alguém deverá deitar-se
de espiga nos dentes
olhando as nuvens
O Fim e o Princípio
por
Wislawa Szymborska
quarta-feira, 29 de setembro de 2010
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