Nem só de mulheres inconformadas é feito Matem as Mulheres Primeiro. Um dos casos descritos quebra em absoluto a noção de marginalidade que pauta os restantes. Uma das mulheres entrevistadas foi claramente manipulada pelo seu contexto a fim de se tornar numa executante quase perfeita dos desígnios da sua Pátria. Kim Hyon Hui foi uma norte-coreana encarregue de fazer explodir um voo que tinha por destino Seul, no ano anterior aos Jogos Olímpicos.
Segundo a autora, esta mulher foi a única que não manifestou o mínimo de confusão mental em relação às suas acções. Aliás, a haver emoção, esta residia não na perspectiva do sofrimento que inflingiria às vítimas e seus familiares, mas sim em relação à envergadura da acção que lhe tinha sido exigida pelo seu País, sendo ela tão nova (à data da captura tinha 25 anos). O perfil desta mulher não se coaduna minimamente com as restantes: não pretende mudar o sistema em que vive, não almeja alcançar uma mudança social profunda mesmo que a custo da perpretação de violência contra terceiros. A justificação prestada relembra essa outra apresentada em 60 por Eichmann em Jerusalém: limitou-se a cumprir ordens.
É preciso compreender o ambiente em que Kim viveu. "É uma sociedade enigmática e paranóica. as populações vivem em pequenas unidades habitacionais e uma em cada cinco famílias está incumbida de informar o Estado das actividades dos vizinhos e dos próprios familiares. As crianças são induzidas a pôr a lealdade ao Estado à frente da lealdade à família. " Mais à frente podemos ler que "O Partido dizia às mães que não se preocupassem em dar mimos e atenções às crianças em casa. eles encarregar-se-iam de lhes dar tudo o que elas precisavam. O sistema tinha por função conceber revolucionários convictos e trabalhadores e estava organizado de modo a evitar a influência parental. Horários de trabalho sobrecarregados faziam com que não sobrasse tempo às mães para se dedicarem aos filhos. (...) as crianças eram obrigadas a frequentar diversos movimentos infantis e juvenis de apoio ao regime depois da escola." Obviamente que um sistema destes está delineado para a formatação das massas, para a uniformização do pensamento. Ou melhor, para a ausência dele. Criam-se autómatos, cumpridores de um desígnio maior - que no caso era o Estado e o bem do Grande Chefe. Uma das características mais marcantes na leitura do percurso de Kim é a de que é uma mulher profundamente conservadora, que sempre tentou corresponder às expectativas do seu País. Nunca foi incitada a pensar e os ensinamentos sempre lhe foram apresentados como verdades absolutas. E uma verdade não é contestada, à verdade obedece-se, porque não apresenta dúvidas, porque é a melhor para todos. Porque é clara e distinta.
O pensamento que se apresenta como uniforme e pouco susceptível à dúvida não chega a ser pensamento. A educação resume-se a adestramento e a jogos mentais equivalentes às proezas que ensinamos o nosso animal de estimação a fazer para exibir perante terceiros.
Alguns dos relatos referentes a esta mulher aproximam-se perigosamente à forma como cada vez mais nos organizamos e educamos as nossas crianças. Estranhamos cada vez mais a diferença, ainda que a tentativa de anulação da mesma recorra a metodologias mais discretas. Formamos essencialmente funcionários especializados. E um funcionário não questiona, não repensa, não se distancia. Um funcionário, cumpre as ordens de alguém que acredita pensar melhor que ele.
Segundo a autora, esta mulher foi a única que não manifestou o mínimo de confusão mental em relação às suas acções. Aliás, a haver emoção, esta residia não na perspectiva do sofrimento que inflingiria às vítimas e seus familiares, mas sim em relação à envergadura da acção que lhe tinha sido exigida pelo seu País, sendo ela tão nova (à data da captura tinha 25 anos). O perfil desta mulher não se coaduna minimamente com as restantes: não pretende mudar o sistema em que vive, não almeja alcançar uma mudança social profunda mesmo que a custo da perpretação de violência contra terceiros. A justificação prestada relembra essa outra apresentada em 60 por Eichmann em Jerusalém: limitou-se a cumprir ordens.
É preciso compreender o ambiente em que Kim viveu. "É uma sociedade enigmática e paranóica. as populações vivem em pequenas unidades habitacionais e uma em cada cinco famílias está incumbida de informar o Estado das actividades dos vizinhos e dos próprios familiares. As crianças são induzidas a pôr a lealdade ao Estado à frente da lealdade à família. " Mais à frente podemos ler que "O Partido dizia às mães que não se preocupassem em dar mimos e atenções às crianças em casa. eles encarregar-se-iam de lhes dar tudo o que elas precisavam. O sistema tinha por função conceber revolucionários convictos e trabalhadores e estava organizado de modo a evitar a influência parental. Horários de trabalho sobrecarregados faziam com que não sobrasse tempo às mães para se dedicarem aos filhos. (...) as crianças eram obrigadas a frequentar diversos movimentos infantis e juvenis de apoio ao regime depois da escola." Obviamente que um sistema destes está delineado para a formatação das massas, para a uniformização do pensamento. Ou melhor, para a ausência dele. Criam-se autómatos, cumpridores de um desígnio maior - que no caso era o Estado e o bem do Grande Chefe. Uma das características mais marcantes na leitura do percurso de Kim é a de que é uma mulher profundamente conservadora, que sempre tentou corresponder às expectativas do seu País. Nunca foi incitada a pensar e os ensinamentos sempre lhe foram apresentados como verdades absolutas. E uma verdade não é contestada, à verdade obedece-se, porque não apresenta dúvidas, porque é a melhor para todos. Porque é clara e distinta.
O pensamento que se apresenta como uniforme e pouco susceptível à dúvida não chega a ser pensamento. A educação resume-se a adestramento e a jogos mentais equivalentes às proezas que ensinamos o nosso animal de estimação a fazer para exibir perante terceiros.
Alguns dos relatos referentes a esta mulher aproximam-se perigosamente à forma como cada vez mais nos organizamos e educamos as nossas crianças. Estranhamos cada vez mais a diferença, ainda que a tentativa de anulação da mesma recorra a metodologias mais discretas. Formamos essencialmente funcionários especializados. E um funcionário não questiona, não repensa, não se distancia. Um funcionário, cumpre as ordens de alguém que acredita pensar melhor que ele.
2 comentários:
Se as pessoas pensarem desaparece a sociedade.
Ainda tenho de comentar os Baader-Meinhof mas hoje não tenho tempo.
Tal como a conhecemos.
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