Quem entra em sala de aulas sabe que, a determinada altura, os alunos insistem em saber quando lhe daremos feriado. É quase um ritual de boa disposição, a repetição da pergunta e o engendramento de uma resposta igual na substância, mas diferente na forma. Há um ano atrás, poucos dias antes do dia 25, anunciei aos meus alunos que não teriam aula de Filosofia na quarta-feira seguinte. À festa inicial sobrepôs-se a voz sábia de um deles: "Oh, não façam festa, que nesse dia é mesmo feriado." Perante a minha indagação sobre o motivo para termos um feriado a 25 de Abril, respondeu-me que "Era o dia da guerra".
A persistência da memória tem sido a nossa maior batalha. Numa organização social em que o instante é lei, em que o presente é tirano, a memória - ou a falta dela - é recebida, na maior parte das vezes, com um encolher de ombros enfadado. A deificação do momento tem-nos afastado cada vez mais dos escombros do que fomos, sem que nos apercebamos de que o esquecimento é perda, em última instância, de nós mesmos.
Aparentemente, acreditamos cada vez mais em nós, de uma forma sobranceira e pouco realista. Ou se calhar, acreditamos cada vez menos, já que nos assumimos cada vez mais sem memória. E como responder se já não recordamos a pergunta?
3 comentários:
Eu gosto de tudo que o 25 de Abril representa: feriado, liberdade, cravos perfumados, Primavera, História e, acima de tudo, a "nossa guerra", a melhor de todas!
Muito bem lembrado, Woman.
Vim até aqui pelo link no blog Entre Deus e o Diabo. Achei o texto muito bem escrito.
Muito obrigada Redonda. Já a conheço do blog do camarada Funes. ;)
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