domingo, 28 de janeiro de 2007

Sou chamada a responder...

Apesar de farta, não consigo adiar mais esta questão. Por cá já a debatemos furiosamente em outros contextos. Concordo em absoluto que esta seria matéria para nem chegar a ser referendada. A coragem política não se traduz única e exclusivamente em meter a mão no bolso do contribuinte. Mas não se espere desde Executivo uma posição corajosa, especialmente quando se tratam de questões humanas. Lava as mãos, como o outro da Bíblia (que nos últimos tempos, muitos bramem no ar). Em consequência desta falta de coragem, nunca este País teve tantos "defensores da vida", principalmente quando a (triste) decisão é de um outro - e ainda por cima feminino. Os argumentos sucedem-se... e por estes dias, a mulher (grávida?) corre o risco de ganhar (velha) nova dimensão ontológica: desde armazém, prostituta, depravada ou acéfala, muito se lê e se ouve por aí. Os mesmos que agora alegam assassínio e levantam as mãos ao alto serão exactamente os mesmos que, no dia imediatamente a seguir ao referendo (a prevalecer o não), prosseguirão a sua vidinha de sempre, mais preocupados em controlar a vida do vizinho mais próximo, à falta de causa maior (por hora). Da educação sexual por que todos clamam, não se ouvirá falar. Da necessidade de maior apoio à mulher grávida em condições precárias, também não. Porque foi isso que aconteceu anteriormente... Este post é um pretexto, porque não resisto a este texto de um antigo professor: "Numa questão tão delicada, com a vida e a morte em jogo, não se pretende que haja vencedores nem vencidos, mas um diálogo argumentado, para lá da paixão e mesmo da simples compaixão. Ficam alguns pontos para reflectir. 1. O aborto é objectivamente um mal moral grave. Aliás, ninguém é a favor do aborto em si, pois é sempre um drama. 2. A vida é um bem fundamental, mas não é um bem absoluto e incondicionado. Se o fosse, como justificar, por exemplo, o martírio voluntário e a morte em legítima defesa? 3. Para o aparecimento de um novo ser humano, não há "o instante" da fecundação, que é processual e demora várias horas. A gestação é um processo contínuo até ao nascimento. Há, no entanto, alguns "marcos" que não devem ser ignorados. É precisamente o seu conhecimento que leva à distinção entre vida, vida humana e pessoa humana. O blastocisto, por exemplo, é humano, vida e vida humana, mas não um indivíduo humano e, muito menos, uma pessoa humana. Se entre a fecundação e o início da nidação (sete dias), pode haver a possibilidade de gémeos monozigóticos (verdadeiros), é porque não temos ainda um indivíduo constituído. Antes da décima semana, não havendo ainda actividade neuronal, não é claro que o processo de constituição de um novo ser humano esteja concluído. De qualquer modo, não se pode chamar homicídio, sem mais, à interrupção da gravidez levada a cabo nesse período. 4. Sendo o aborto objectivamente um mal, deve fazer-se o possível para evitá-lo. Tudo começa pela educação e formação. Impõe-se uma educação sexual aberta e responsável para todos, que, não ficando reduzida aos aspectos biológicos e técnicos, tem de implicá-los, fazendo parte dela o esclarecimento, sem tabus, quanto à contracepção. 5. O aborto é uma realidade social que nem a sociedade nem o Estado podem ignorar. Como deve então posicionar-se o Estado frente a essa realidade: legalizando, liberalizando, penalizando? 6. Não sem razão, pensam muitos (eu também) que, se fosse cumprida, a actual lei sobre a interrupção da gravidez, permitida nos casos de perigo de morte ou grave e duradoura lesão para a mãe, de nascituro incurável com doença grave ou malformação congénita e de crime contra a liberdade e autonomia sexual (vulgo, violação), seria suficiente. 7. De qualquer forma, vai haver um referendo. O que se pergunta é se se é a favor da despenalização do aborto até às dez semanas, em estabelecimentos devidamente autorizados, por opção da mulher. Por despenalização entende-se que, a partir do momento em que não há uma pena, a justiça deixa de perseguir a mulher que aborta e já não será acusada em tribunal. Aparentemente, é simples. Mas compreende-se a perplexidade do cidadão, que, por um lado, é a favor da despenalização - despenalizar não é aprovar e quem é que quer ver a mulher condenada em tribunal? -, e, por outro, sente o choque de consciência por estar a decidir sobre a vida, realidade que não deveria ser objecto de referendo. O mal-estar deriva da colisão dos planos jurídico e moral. 8. Impõe-se ser sensível àquele "por opção da mulher" tal como consta na pergunta do referendo, pois há aí o perigo de precipitações e arbitrariedades. Por isso, no caso de o "sim" ganhar, espera-se e exige-se do Estado que dê um sinal de estar a favor da vida. Pense-se no exemplo da lei alemã, que determina que a mulher, sem prejuízo da sua autonomia, deve passar por um "centro de aconselhamento" (Beratungsstelle) reconhecido. Trata-se de dialogar razões, pesar consequências, perspectivar alternativas. A mulher precisará de um comprovativo desse centro e entre o último encontro de aconselhamento e a interrupção da gravidez tem de mediar o intervalo de pelo menos três dias. As custas do aborto ficam normalmente a cargo da própria. O penalista Jorge Figueiredo Dias também escreveu, num contexto mais amplo: "O Estado (...) não pode eximir-se à obrigação de não abandonar as grávidas que pensem em interromper a gravidez à sua própria sorte e à sua decisão solitária (porventura na maioria dos casos pouco informada); antes deve assegurar-lhes as melhores condições possíveis de esclarecimento, de auxílio e de solidariedade com a situação de conflito em que se encontrem. Sendo de anotar neste contexto a possibilidade de vir a ser considerada inconstitucional a omissão do legislador ordinário de proporcionar às grávidas em crise ou em dificuldades meios que as possam desincentivar de levar a cabo a interrupção"."
Anselmo Borges DN de 21 de Janeiro de 2007

20 comentários:

Anónimo disse...

esta abordagem para mim é que tem todo sentido! o referendo é que não tem qualquer sentido... ou se calhar até tem na sociedade portuguesa que se pauta desde sempre pelo atraso.

Anónimo disse...

repugna-me ir às urnas pôr um sim ou um não... Não havia necessidade, a saúde pública já é um direito... Julgo que a dignidade humana não deveria ser discutida desta forma!

Edelweiss disse...

Excelente ideia, essa do "centro de aconselhamento".

Sancho Gomes disse...

Quando também está tão em voga criticar os clérigos, acho que seria importante nformar que o Anselmo Borges é padre.

Definitivamente, nesta discussão, nunca estaremos de acordo!

Woman Once a Bird disse...

Meu querido Sancho:
Pois não. Nesta questão, parece-me que nunca estaremos em acordo.
Quanto ao facto do Anselmo ser Padre, toda a regra tem a sua excepção... Simplesmente, não alinha em "posições" concertadas. Muito provavelmente, também ele não está sindicalizado...

Edelweiss:
A isto é que eu chamo "defesa da Vida". Não ao escamotear o problema e assobiar para o lado. Infelizmente, tenho para mim que este resultará como o outro... Bem fizeste tu.

Bayushiseni disse...

O aborto é um direito incondicional de qualquer mulher que não queira ter um filho. Deverá ser feito com o máximo de dignidade e o mais cedo possível. Quem acha que pode inflingir a obrigatoriedade de uma gravidez a uma mulher é um criminoso e um tirano. Um estado que o faz é um tirania criminosa e não democrática. Ou então:

Temos que prender todos os homens que se masturbem, porque estão a assassinar milhões de meias crianças;

Temos que prender todas as mulheres que se menstruem porque estão a assassinar uma meia criança;

Temos de acabar com as pílulas, preservativos e outros anti-concepcionais.

Que, estranhamente, é o que a igreja sempre desejou.

Se deus quer que procriemos como coelhos devia ter-nos feito coelhos!

Sancho Gomes disse...

WOAB,

gostei do "meu querido". Estavas muito furiosa;)?

Também gostei da provocação do sindicato. Teve piada... Mas não te esqueças que a posição do Anselmo não está assim tão distante da do Cardeal Patriarca de Lisboa, apesar de algumas divergências naturais.

Quanto a mim, acho que existe uma moda progressista na Igreja contemporânea (consequências da famigerada Teologia da Libertação sul-americana?) que me começa a irritar. Não se arranja por aí uma inquisiçãozinha para julgar os homens e mulheres a que a "provavelmente talisca" se refere?! É que começa a fazer falta. Não só para esses homens e mulheres, mas também para os que evocam o Seu Nome em vão!

Woman Once a Bird disse...

Meu queridíssimo Sancho (imagina o grau de irritação):
Qual a tendência "progressista" na Igreja Católica? Porque eventualmente os seus membros atrevem-se a um posicionamento diferente da posição oficial? Porque alguns membros desconstroem a fé cega em ditames humanos disfarçados de divinos?
Contudo, concordo com a rebelião quanto à evocação do Nome em vão:
veja-se a quantidade de posicionamentos políticos assumidos em Seu Nome...

Bayushiseni disse...

Caro Sancho Gomes:

Alegro-me sempre que alguém me confunda com uma mulher. Não porque tenha algum desejo de ser uma mulher, gosto muito de ser homem, mas sim porque quando me confundem com uma mulher isso me diverte imenso.

Nunca se invoca deus em vão. Deus não é o nome de deus, é o nome que se dá ao conjunto de todos os homens. É a mesma coisa do que invocar o nome do Homem em vão.

Aliás sou completamente a favor de se invocar o nome de deus por tudo e por nada. É para lhe tirar importância. Assim quando alguém com interesses muito soturnos invocar o seu nome não ligamos nada.

"God himself is lost and needs help."

Sancho Gomes disse...

Provavelmentetalisca,

dá-me igual ao litro você ser homem ou mulher. Quanto à sua interpelação, não percebi peva. Mas devo ser eu que não entendo essas patacoadas de uma certa-esquerda-bemfalante-policicamente-correcta-e-defensora-do-ateísmo!

Bayushiseni disse...

Caro Sancho Gomes:

Sim, deve ser você que não entende nada.

Aliás, ao longo da minha vida reparo que quem normalmente não entende nada é que costuma atacar os outros com frases feitas como "patacoadas de uma certa-esquerda-bemfalante-policicamente-correcta-e-defensora-do-ateísmo!"

Oh quantas vezes, meu caro Sancho Gomes!

Defensor do raio do "ataísmo", eu? Eu, meu caro Sancho? Não sou assim tão presunçoso. Não faço a mínima sobre deus e o universo. Se existe, existe. Se não existe, não existe. Não tenho dados nem sobre uma coisa nem sobre a outra. Deixo isso para os presunçosos dos que criam religiões. Eu simplesmnte não faço ideia. Mas não sou estúpido e nada politicamente correcto. Observo as religiões todas que me são oferecidas na montra das crenças e acho-as a todas muito parcas. Parcas de verdade (mas isso é o menos) parcas de inteligência e isso é que custa mais.

Porque aglutinam à volta delas pessoas que também não gostam de pensar, não gostam de duvidar, não gostam de causar ondas e que gostam de fasezinhas feitas sussurradas por um qualquer senhor prior de rabiosque gordo que diz "patacoadas de uma certa-esquerda-bemfalante-policicamente-correcta-e-defensora-do-ateísmo!"

E as pessoas saem contentes por terem qualquer coisita para repetir.

Que tristonho.
Que tristonho.

Sancho Gomes disse...

Talisca (posso tratá-lo pelo seu segundo nome?),

você afirma: "(...) ao longo da minha vida reparo que quem normalmente não entende nada é que costuma atacar (...)", e depois diz: "Deixo isso para os presunçosos dos que criam religiões".
Você garante não ser presunçoso, mas depois considera que todas as religiões são "Parcas de verdade (mas isso é o menos), parcas de inteligência". Você assume uma posição de suposta neutralidade e depois afirma que as religiões "aglutinam à volta delas pessoas que também não gostam de pensar, não gostam de duvidar", pressupondo que todas os crentes são tolos. Por fim, depois e um discurso de bem, acusa-me de repetir as frases feitas de um estereótipo clerical.

O seu comentário não terá outra resposta, porque está demasiado minado de incoerências que o fazem ruir.

Áh, e já agora não seja tão paternalista. É que isso fica bem no seu círculo de amigos, mas não passa de uma tolice entre pessoas que não se conhecem. E também não permita que o seu alter-ego blogger se leve tão a sério. Porque isto é só um passatempo!

Boas pescarias no Guadiana, mas veja se não apanha nenhum saramugo, porque estão em vias de extinção!

Fique com o amor de Cristo.

Woman Once a Bird disse...

Caro Sancho:
És um exagerado. Quem te lê fica a pensar que és um fundamentalista religioso. e não és. O teu maior pecado também é o meu: não gostas de ser contrariado.
O amor de Cristo não é para aqui chamado. nem para aqui nem para nada que tenha que ver com este referendo (convenhamos).
Kisses

Sancho Gomes disse...

Apanhado! Mas esqueceste do prazer da provocação.;)

Bayushiseni disse...

Caro Sancho Gomes:

Claro que pode tratar-me por Talisca.

Tem que ler com mais atenção o que eu escrevo apenas por "passatempo". É que é importante além de ler saber interpretar. Eu disse que não sei nada sobre deus, não sobre as religiões. É que estamos a falar de coisas diferentes, caro Sancho. Sou completamente parcial em relação às religiões.

Conheço a importância cililizadora das religiões. A capacidade para a diplomacia e para a paz, para a manutenção da lei e para a defesa das mulheres, que foram cavalos de batalha de diversas religiões.

Acredito que quem criou certas religiões, tenha acreditado no que estava a fazer.

Acredito que haja pessoas que acreditam na religião que mantêm.

Mas também acredito que tem que se ser muito presunçoso para se achar que o seu deus tem toda a razão e que se deve fazer as coisas conform a sua religião o afirma. Basta olhar à volta e ver.

"Você garante não ser presunçoso, mas depois considera que todas as religiões são "Parcas de verdade (mas isso é o menos), parcas de inteligência". Não meu caro Sancho. Eu disse que não era presunçoso para decidir a existência de deus. Mas tenho opiniões. E fortes. E defendo-as fortemente, logo sou presunçoso nisso. Interprete, mas dentro do texto dado. É o que eu digo aos meus alunos.

"Você assume uma posição de suposta neutralidade e depois afirma que as religiões "aglutinam à volta delas pessoas que também não gostam de pensar, não gostam de duvidar", pressupondo que todas os crentes são tolos." Não, caro Sancho, não assuma por mim. Eu não disse que todos os crentes são uns tolos. Conheço muitos crentes não tolos. Mas as religiões têm a possibilidade, a fraqueza e a tentação de aglutinarem os mais fracos de espírito à sua volta. "Vinde a mim os pobres de espírito, que deles é o reino dos céus." Isto não é uma presunção minha é um dado estatístico. Mas não quer dizer que grandes espíritos, profundas inteligências, não sejam crentes e religiosos.

Onde é que estão as incoerências? Ou será que o caro Sancho prefere não ver para não ter que pensar?

E repetindo a sua frase: E já agora não seja tão paternalista. É que isso (nem sequer) fica bem no seu círculo de amigos, etc, etc.

"E também não permita que o seu alter-ego blogger se leve tão a sério. Porque isto é só um passatempo!" Caro sancho, o aborto nunca será apenas um passatempo para mim. E custa-me pensar que neste país de gente hipócrita, papa hóstias e maldizente, mais uma vez o não é capaz de ganhar e as mulheres vão ter que ficar com duas chagas (não religiosas) quando tiverem que fazer um aborto e não apenas uma.

Não pesco. E o saramugo é um peixe que não exisite no Guadiana, mas sim nas ribeiras afluentes do Guadiana e sim, infelizmente está em vias de extinção.

Prefiro o amor das pessoas que me rodeiam, muito obrigado. Não se preocupe, que eu não lhe ofereço o amor dos meus pais, porque seria inconveniente para si e para os meus pais.

Uma boa semana para si.

Sancho Gomes disse...

Provavelmente (já que começámos a ter uma relação mais íntima, vou tratá-lo pelo primeiro nome),

Esta nossa conversa começa a parecer uma conversa de surdos. Cada um fala e nenhum entende.

1. Como provavelmente não foi óbvio, informo-o que muitas das minhas afirmações foram em tom de brincadeira e algumas em tom de provocação. Parece que para si toda esta troca de escritinhos tem sido levada a sério (não confundir com o tema em discussão). Para mim é complicado argumentar seriamente quando alguém compara fetos/embriões/nascituros com espermatozóides ou óvulos. Porque essa argumentação não pode ser levada a sério, por motivos tão evidentes que nem os vou explicar (repare que nem o Alexandre Quintanilha, ou a minha radical amiga WOAB, o fazem tão displicentemente). Não leve, portanto, a mal que eu não considere essas suas afirmações ou que as entenda como uma piada, porque verdadeiramente é isso que elas são. Para além disso, rir é bom e não concebo criar assuntos tabu. Defendi-o aquando da polémica dos cartoons, defendi-o quando o Louro fez a caricatura do Papa, defendi-o quando me ri à grande com o boneco do Marcelo no “Diz que é uma espécie de magazine” e defendo-o agora.


2. Acreditar em Deus, tenha Ele que Nome tiver, é reconhecer o Absoluto. É aceitá-lo. Não faz, portanto, qualquer sentido não O reconhecer como Verdade Suprema. Não é presunção, é uma demonstração de humildade por parte de quem crê. O que não quer dizer que um crente não questione. Garanto-lhe que os verdadeiros crentes são aqueles que mais questionam.
Também não quer dizer que o crente aceite impavidamente todos os ditames da Religião que professa, ou sequer que concorde com todos os clérigos. Mas daí até criticar as posições da Igreja e dos seus membros por partilharem algumas orientações religiosas (digamos) universais vai um caminho (esse sim, presunçoso) todo minado por falácias.

3. Por outro lado, disse que as Religiões têm “a possibilidade, a fraqueza e a tentação de aglutinarem os mais fracos de espírito à sua volta” e mais, garante que este é um dado estatístico. Como vê, não estou a assumir por si. A afirmação é sua! E, mais uma vez só posso encarar esta sua afirmação como uma piada (e você, que parece aconselhar tão bem os seus alunos, não lhes aconselha rigor?.

4. O seu discurso não é apenas incoerente, é superficial, fica apenas no acessório. Mas essa, naturalmente, é uma opinião minha, não é qualquer verdade absoluta.


5. Fala, também, de frases feitas. Gosto de saber que “neste país de gente hipócrita, papa hóstias e maldizente” é uma originalidade (nada tenho contra frases feitas. Radicalmente, estas significam pré-conceitos e estes estimulam a criatividade de pensamento).

6. Como demonstração de humildade, não leve tão a sério o que escrevo no blog que (desculpem lá a apropriação!) também é meu.

7. Com isto dou por concluída esta nossa divergência. Boa semana também para si.


PS – Reveja os seus conceitos de biologia (ou terei eu e todos os biólogos e ambientalistas que comigo trabalharam num projecto de interpretação e educação ambiental no Alentejo, rever os nossos), mas o saramugo é uma espécie que da bacia hidrográfica do Guadiana, incluindo o próprio.

Bayushiseni disse...

Caro Sancho Gomes:

Provavelmente acho que pode tratar-me por qualquer nome que queira.

Nós podemos não nos entender, mas deixe lá os surdos fora disto que eles entendem-se bem. Nós é que não nos queremos entender.

Deixe-me dizer-lhe que fico muito contente quando vejo uma das suas respostas. São interessantes. Nunca me aborrece estar errado, note, mas continuemos.

Não fique com a impressão errada de que as minhas palavas mais acutilantes são completamente sérias. Divirto-me absolutamente com esta troca de palavras. E estou sempre a tentar provocá-lo. E parece-me que até consigo...

Em relação ao ponto UM-Único: É sarcasmo, comparar espermatozóides e óvolos, com apenas metade dos cromossomas necessários a ser-se um ser humano com o producto final. É sarcasmo, ironia, abuso, como forma de mostrar o extremismo do outros lado. Nao se deixe levar simplesmente pelas palavras. Veja as imagens por trás delas. Sempre é melhor do que a cartinha que o feto mandou aos pais... Quer dizer, tem menos mau gosto...

A sua amiga WOAB é radical? Estranho. Eu diria que não. Ela prega em púlpitos, tenta levar as pessoas a fazer o que ela acha correcto através de meios menos lícitos? (Avise-me se ela fizer isso, porque não gosto de admirar pessoas que fazem disso.) Ou é apenas radical porque defende opiniões que o mainstream não defende?

Será que não acha nenhum assunto tabu? E tem assim tão bom humor? Não achou piada à ideia de prender mulheres que menstruassem. Eu acho a ideia genial... Mas enfim, o eu humor é difícil.

Finalmente. O Marcelo é uma piada. Isso não é argumento, caro Sancho Gomes.

Em relação ao ponto DOIS-Único. "Acreditar em Deus, tenha Ele que Nome tiver, é reconhecer o Absoluto." Que presunção. Nós os que não acreditamos em nenhum deus não reconhecemos o absoluto, é isso? Com a mania de arranjarem razões genéticas para tudo ainda vão conseguir provar que somos deficientes porque não temos o gene que reconhece deus no absoluto. (Se calhar é melhor não dizer isto, que ainda acabam mesmo por utilizá-lo.)

Deixe-me dizer-lhe uma coisa, Caro Sancho Gomes. Moro ao pé do castelo de Mértola. A minha vizinha mais próxima, numa ruela que vai perdendo moradores à medida que a velhice os vai levando é uma senhora velhinha, simpática e muito sozinha que fica encantada quando vê o meu carro porque "me conforta ver aí o seu carro, vizinho", e que me deseja todos os dias "um bom dia na companhia de Deus". Agradeço-lhe. Reconheço-lhe a preocupação e gosto muito dela. Mas eu não quero a companhia de deus. Não lho digo. Não sou ingrato. Sei que me oferece a companhia de deus com amor. Mas não lhe ofereço a minha descrença. Nem a ninguém. Mas os crentes acham que têm o direito de impingir as sua (na minha opinião) falsidades como se lhes fosse um direito adquirido. Não é ridículo e hilariante ao mesmo tempo?

O que faz com que a citação seguinte me faça ficar com os olhos marejados de lágrimas. Ora veja: "Não é presunção, é uma demonstração de humildade por parte de quem crê." Você é um verdadeiro cómico, meu caro Sancho.

Criticar as posições das igrejas, de todas, no nosso caso a católica, deveria ser uma obrigação do cidadão enquanto cidadão. E deixe-se disso, meu caro Sancho, porque parece hipocrisia. Defendeu o António quando desenhou o preservativo no nariz do Papa? Eu, na altura um jovem, escrevi um artigo que foi publicado no DN Jovem a defender o António. Mas agora passado tanto anos é que diz isso? Daqui a dez anos também dirá que defendeu o SIM?


Em relação ao ponto TRÊS-Único. Disse e mantenho que as Religiões têm “a possibilidade, a fraqueza e a tentação de aglutinarem os mais fracos de espírito à sua volta” e mais, garante que este é um dado estatístico.

Basta informar-se, caro Sancho. E basta usar o seu intelecto. Basta ler as escrituras sagradas de várias religiões. Não digo todas porque não li todas. Mas têm alguns pontos em comum:

Utilizam o medo para criar crentes. Se não me adorares, serás castigado. Quanto mais fraco é o ser humano, mais o medo trabalha em si.

Utilizam a chantagem: Se não me adorares, não entrarás no sítio maravilhoso que eu tenho aqui guardado para aqueles que dançarem ao som da minha música.

Uma pessoa até pode intelectualmente concordar com uma religião. Mas esses são uma minoria. A maioria tem medo do universo e do futuro e do desconhecido e agarra-se à religião (que até promete protecção) por causa do medo. Basta atentar nas palavras que mais vezes invocam o nome de Deus: "Que deus me proteja." "Que deus te guarde." "Deus nos salve."

A afirmação é mesmo minha e assumo-a!

Você tem piada, caro Sancho! Aconselhar rigor aos meus alunos? Quando eu consigo que eles pensem noutra coisa que não na Floribela ou nos Morangos com Açúcar já vou para casa a pensar que o meu dia valeu a pena. Rigor? Você tem piada.

Ponto QUATRO-Único.

"O seu discurso não é apenas incoerente, é superficial, fica apenas no acessório. Mas essa, naturalmente, é uma opinião minha, não é qualquer verdade absoluta." Não se importava que eu utilizasse a sua frase para comentar os seus comentários, pois não? É que me parece perfeita.

O meu pai defende a fé. Diz. Acredito. Basta-me. Acho justo. Agora, arranjar provas para a existência de deus, que sejam menos do que o tal ser absoluto aparecer para beber um café com a malta é que me parece insuficiente, superficial e acessório. E só não me faz rir ainda mais porque é tão perigoso, não é?

Milhões e milhões mortos em nome dos Deuses e das religiões...

Ponto qualquer coisa-qualquer coisa.

"Gosto de saber que “neste país de gente hipócrita, papa hóstias e maldizente” é uma originalidade (nada tenho contra frases feitas. Radicalmente, estas significam pré-conceitos e estes estimulam a criatividade de pensamento)."

Concordo com a primeira parte, tenho algumas dúvidas em relação à segunda parte, não concordo com as aspas e não entendi a parte da originalidade...

Em relação ao 6. Não levo. Palavra que não levo. Gosto de discutir estas coisas, caro Sancho Gomes. E com gente de fé é mais divertido...

7. Com isto estará concluída esta nossa divergência? Boa semana também para si também.


PS ao PS – Reveja os seus conceitos de biologia. Trabalhei na Associação de Defesa do Património de Mértola e fiz acções de Educação Ambiental em 2006 e se houver algum Saramugo no Guadiana é porque se perdeu. Os níveis de toxicidade estão acima do que os saramugos suportam. Em alguns dos afluentes também já desapareceram, veja-se o caso da Ribeira do Chança. As populações de maior número nesta zona estão na Ribeira do Vascão. (Mas a informação que tenho pode estar errada. Não tenho a mão de Deus do meu lado a oferecer-me o absoluto.) Brincadeirinha, caro Sancho Gomes, não estou a dizer que utiliza a fé no seu trabalho de experimentação...

Sancho Gomes disse...

Provavelmente,

apenas duas notas:
1. Se for a etimologia da palavra radical, entenderá o que eu quero dizer.

2. Não o chamei mentiroso, pois não? Para além disso, neste quid pro quo o único que assina em nome próprio sou eu, não sou?

Acho que estamos esclarecidos!

PS - Insisto, você continua a levar-se e( pior!) a levar-me demasiado a sério.

Sancho Gomes disse...

Só mais uma coisinha: em relação ao saramugo, aconselho-o a seguinte leitura:
- Collares-Pereira M J, Rodrigues JA, Rogado L & Cowx. IG (2000a). Plano de Gestão para a
Conservação do Saramugo. Programa Life-Natureza, contrato B4-3200/97/280. Centro de Biologia
Ambiental - Faculdade de Ciências de Universidade de Lisboa/Instituto da Conservação da Natureza.
Lisboa.
- Collares-Pereira M J, Cowx IG, Rodrigues JA, Rogado L, Ribeiro F, Mendes A, Pichiochi P,
Salgueiro P, Alves MJ & Coelho MM (2000b). Uma estratégia de conservação para o saramugo
(Anaecypris hispanica), um endemismo piscícola em extinção. Relatório Final, Programa LIFENatureza,
contrato B4-3200/97/280, Volumes I e II.
- Collares-Pereira MJ, Moreira da Costa L, Filipe AF, Gomes Ferreira A, Botelho S, Mieiro C, Ribeiro
F & Tiago P (2002). Programa de monitorização para o património natural. PMo 2.1 - Monitorização
de peixes dulciaquícolas. Área de Regolfo de Alqueva e Pedrogão. 3º Relatório de Progresso. Centro
de Biologia Ambiental - Faculdade de Ciências de Universidade de Lisboa, Lisboa.
- Doadrio I (ed.) (2001). Atlas y Libro Rojo de los Peces Continentales de España. Dirección General
de Conservación de la Naturaleza, Museo Nacional de Ciencias Naturales, Madrid.

Para além disso você poderia ter dito logo que trabalhou para a ADPM, essa referência nacional de conservação de espécies...

Bayushiseni disse...

Caro Sancho Gomes,

Na verdade também não acho a ADPM uma grande referência na conservação de espécies, mas alguma coisa faz.

Caro Sancho, já parece o meu pai, he he! Quando a coisa começa a falhar-lhe vai á etimologia. Às vezes chega mesmo a dizer que os gregos é que sabiam...

Claro que não me chamou de mentiroso, caro Sancho. Somos duas pessoas civilizadas, um de nós um bocado radical, mas capazes de trocar impressões com cavalheirismo! Mas não sabia que tinha que assinar com o meu nome. As regras do blog estão bastante explícitas... Porque é que atira com essa farpa?

PS ao PS - Insisto, você continua a levar-se e( pior!) a levar-me demasiado a sério.